Oferta ajustada de trigo não dá espaço para quebra de safra
Colheita de trigo em Escalles, perto de Calais (França). Foto Pascal Rossignol - Reuters
Com consumo recorde, eventual redução mundial de produção interferiria nos preços.
O trigo, cereal do qual o Brasil tem a principal dependência externa, é um dos que apresentam as maiores dúvidas nesta safra 2024/25. Os dados atuais do setor indicam demanda externa mundial recorde, acima da produção.
Os estoques mundiais são os menores em uma década, o que gera incertezas e possíveis aumentos de gastos para o país, que novamente volta a importar 50% do que consome.
No cenário mundial, a produção sobe para 794 milhões de toneladas, tendo como destaques China, União Europeia, Índia, Rússia e Estados Unidos. Juntos, produzem 64% da oferta mundial do cereal. O Brasil é o 12° maior produtor.
A líder China, com previsão de produção de 140 milhões de toneladas, vai participar mais do mercado mundial porque o consumo interno supera 150 milhões. Já a Rússia, líder em exportações, vai colocar um volume de 48 milhões de toneladas no mercado externo nesta safra 2024/25, bem abaixo dos 55,5 milhões da anterior.
Os diversos países produtores do cereal têm praticamente os mesmos problemas nas lavouras: os efeitos do clima adverso. Chuva em excesso, geadas e secas afetam boa parte das áreas produtivas.
Países importantes no fornecimento mundial também têm queda devido a questões geopolíticas. É o que ocorre com a Ucrânia. Tradicional exportador de trigo, o país colocava próximo de 20 milhões de toneladas do cereal no mercado externo antes de ser invadido pela Rússia. Nesta safra, os ucranianos deverão exportar 16 milhões, o menor volume em dez anos, segundo o Usda (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos).
Produção e demanda mundiais estão no limite dos ajustes. O consumo atingirá o recorde de 803 milhões e, se houver uma quebra substancial em algum dos grandes produtores, os preços aceleram.
Por ora, as áreas mais afetadas são as de União Europeia, Rússia, Índia e Brasil. Os estoques mundiais, atualmente em 258 milhões de toneladas, não ajudam muito diante de uma possível quebra de produção. Nesta safra, correspondem a 32% do consumo mundial, abaixo dos 40% da de 2020.
O comércio mundial de trigo recua para 216 milhões de toneladas neste ano, com Rússia, União Europeia e Ucrânia vendendo 16 milhões de toneladas a menos, volume que não será compensado por Estados Unidos e Argentina, países que elevam as exportações.
Esse cenário internacional não favorece o Brasil, que volta a importar 6 milhões de toneladas. Os preços do cereal para a safra 2024/25 ainda estão bastante incertos, uma vez que, além dos efeitos climáticos sobre a safra, a posição dos fundos de investimentos pode dar novos rumos ao mercado.
Internamente, o Brasil parecia que iria deslanchar na produção. Há duas safras atingiu a marca de 10,6 milhões de toneladas, um volume próximo ao do consumo, que é de 11,9 milhões. Os produtores acreditaram na cultura e, pela primeira vez desde 1990, semearam uma área superior a 3 milhões de hectares.
O resultado das duas safras recentes, no entanto, não foi atraente em termos de rentabilidade. Na atual, os produtores paranaenses que apostaram na triticultura vão ter prejuízo de R$ 1,3 bilhão.
A situação não é muito diferente no Rio Grande do Sul, onde a falta de chuva, a presença dela em momentos inapropriados e doenças reduziram produtividade e qualidade do cereal (Folha, 29/10/24)