25/11/2019

Os desafios do agronegócio – Editorial O Estado de S.Paulo

Os desafios do agronegócio – Editorial O Estado de S.Paulo

Será preciso solucionar deficiências crônicas, como as da infraestrutura, aumentar a produtividade, investir mais em inovação e responder às exigências ambientais.

O agronegócio é o setor mais pujante da economia nacional. Nas últimas décadas o País promoveu uma revolução agrícola. Há meio século o Brasil dependia da importação de comida para alimentar sua população. Hoje é o segundo maior exportador do mundo, atrás dos EUA. A ONU estima que, para suprir a demanda global até 2050, a produção mundial de carne deve dobrar e a de grãos deve aumentar 50%.

Com a maior área de terra agricultável, diversidade de biomas, suprimento abundante de recursos naturais e pesquisas de ponta, o Brasil tem a possibilidade de se tornar a maior potência global. Para otimizar essa oportunidade será preciso solucionar deficiências crônicas, como as da infraestrutura, aumentar a produtividade, investir mais em inovação e responder às exigências ambientais. A edição de 2019 do Summit Agronegócio do Estado deu uma boa ideia do dinamismo do agronegócio brasileiro, assim como de seus desafios.

Em 2019, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o PIB do setor agropecuário deve crescer 1,4%. Para 2020, prevê-se um avanço de 3,2% a 3,7%, com recordes de produção e exportação na lavoura e na pecuária. Como disse o consultor de commodities agrícolas Daniel Hueber, a epidemia da peste suína africana na China “é uma explosão de oportunidades para o Brasil”.No curto prazo, o País também se beneficia da guerra comercial entre EUA e China. “Os EUA perderam fatia do mercado chinês para o Brasil”, disse Hueber, “com um salto de 47 milhões para 64 milhões de toneladas de soja exportadas por ano.”

Contudo, como advertiu o presidente do Grupo Estado, Francisco Mesquita Neto, o sucesso dependerá de investimentos logísticos, “incluindo a infraestrutura de estradas, dos portos e de todos os itens que compõem o escoamento de produção”. A logística de transporte é o fator que mais prejudica a competitividade da agropecuária nacional. A curto prazo, é necessário melhorar as condições das rotas rodoviárias e ampliar a capacidade dos portos. No médio prazo é preciso promover políticas públicas para áreas praticamente inexploradas nos últimos anos, como ferrovias e hidrovias. As perspectivas abertas pelas novas concessões são promissoras, mas está tudo por fazer.

Em relação ao emprego da tecnologia, viu-se no Summit uma série de inovações em curso, desde aplicativos facilitando o acesso ao crédito, até o uso de drones nas lavouras. Grande parte dessas tecnologias é promovida por startups e disponibilizada a pequenos e médios produtores, que podem aumentar a sua produtividade a baixo custo. A disseminação dessas ferramentas, contudo, esbarra mais uma vez em déficits de infraestrutura. Um total de 50 milhões de hectares na área rural ainda não tem acesso à rede digital, prejudicando o emprego dessas tecnologias, a comunicação entre os elos da cadeia e o armazenamento e uso de dados.

Outro grande desafio para o agronegócio é a sustentabilidade, tanto mais considerando-se as manobras erráticas e contraproducentes do governo de turno. Não se trata apenas de aperfeiçoar a legislação, os modelos de produção intensiva, o controle de pesticidas e outras práticas ambientais que já colocam o País na vanguarda da agricultura sustentável.

Trata-se de comunicar adequadamente essas conquistas. “Temos um agro extremamente eficiente, focado em práticas de melhoria e tecnologia”, disse a consultora Andrea Cordeiro, “mas há dificuldade de mostrar lá fora a sustentabilidade do nosso país.” Essa dificuldade, assim como a necessidade de superá-la, foi amplamente reconhecida e debatida no Summit como uma chave primordial para abrir novas portas do mercado externo à produção agropecuária brasileira.

Tudo somado, vê-se que o Brasil está numa posição única de satisfazer duas grandes ambições globais, uma social e outra ambiental: eliminar a fome e preservar a natureza. O País tem tudo para mostrar ao mundo que é possível estabelecer uma relação racional e ética com o universo natural, unindo produção e preservação (O Estado de S.Paulo, 25/11/19)