Paralisação de caminhoneiros continuará, redução da Cide "não resolve"
A paralisação dos caminhoneiros autônomos do país, iniciada na véspera, deve continuar na quarta-feira, apesar do aceno do governo nesta terça-feira sobre redução de um dos tributos que incidem sobre o preço do diesel.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou em conta no Twitter que a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) será zerada com o objetivo de reduzir o preço dos combustíveis. Segundo Maia, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), e ele acertaram com o governo do presidente Michel Temer essa medida.
Porém, o presidente da entidade que organiza o movimento dos caminhoneiros autônomos do país, Abcam, José da Fonseca Lopes, afirmou que a redução da Cide não é suficiente. Enquanto isso, um pequeno corte no preço do diesel anunciado pela Petrobras mais cedo pouco fez para reverter a posição dos caminhoneiros.
“Isso não resolve o problema, a gente quer ser ouvido. Queremos que os tributos no óleo diesel sejam zerados. A Cide representa 1 por cento dos tributos que incidem no combustível”, disse Lopes em resposta a questionamento sobre a chance de a paralisação dos caminhoneiros ser suspensa.
A Abcam estima que cerca de 300 mil caminhoneiros tenham participado dos protestos desta terça-feira, ante 200 mil no dia anterior. A entidade representa cerca de 600 mil caminhoneiros autônomos de um total de 1 milhão de motoristas no Brasil.
O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, disse que os protestos dos caminhoneiros estão gerando problemas pontuais no país, mas montadoras de veículos, incluindo General Motors, Ford e Fiat, um dos poucos setores da economia a apresentar recuperação vigorosa da crise, reportavam problemas logísticos ou paralisações de produção nesta terça.
Segundo a Abcam, foram registrados protestos em 23 Estados.
As manifestações também impactavam produtores de alimentos. Segundo a Associação Brasileira da Proteína Animal (ABPA), oito fábricas de carne suína e de aves do Brasil estão paradas devido a problemas decorrentes dos protestos de caminhoneiros.
“Todo o sistema está comprometido, não tem como girar, o cara tem que parar a planta”, disse o vice-presidente e diretor de mercados da ABPA, Ricardo Santin. A entidade representa mais de 140 agroindústrias e Santin estimou que outras 30 fábricas devem parar na quarta-feira.
A Cooperativa Central Aurora Alimentos, terceira maior produtora de carnes de aves e suínos do país, disse que vai parar totalmente as atividades das indústrias de processamento de aves e suínos em Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul, na quinta e sexta-feira, devido a problemas causados pela greve dos caminhoneiros.
Na mesma linha, o presidente executivo da Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), Péricles Salazar, afirmou que todo o setor de animais vivos, de leite e o abastecimento em geral estão sendo muito afetados.
Com relação aos grãos, o gerente de economia da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), Daniel Amaral, disse que por ora os protestos “ainda não afetaram o embarque e o esmagamento (de soja) de maneira generalizada, mas uma fábrica no Paraná pode suspender o processamento”. Ele preferiu não dizer o nome da empresa.
“Estamos preocupados, mas ainda não houve problema para o abastecimento interno”, disse Amaral. Ele ressaltou, contudo, que o fluxo do produto para os portos foi reduzido.
A última vez que os caminhoneiros promoveram protestos em âmbito nacional foi no início de 2015, quando exigiram redução de custos com combustível, pedágios e tabelamento de fretes.
Os protestos paralisaram dezenas de rodovias em um movimento que afetou as exportações do país. Os caminhoneiros suspenderam o movimento quando o governo aprovou a chamada Lei do Caminhoneiro, que reduziu custos em rodovias com pedágios (Reuters, 22/5/18)
Governo quer zerar Cide sobre diesel quando Congresso aprovar reoneração
Após dois dias de protestos de caminhoneiros por todo o país, o governo fechou um acordo com o Congresso para zerar a cobrança da Cide sobre o óleo diesel, em contrapartida à aprovação do projeto para eliminar a desoneração da folha de pagamentos paulatinamente para todos os setores beneficiados nos próximos dois anos e meio.
Em pronunciamento no Palácio do Planalto, o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia (Foto), disse nesta terça-feira que os presidentes da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), aceitaram votar o projeto que retoma a cobrança da parcela patronal do INSS sobre a folha de pagamento de diversos setores para compensar o fim da arrecadação com a Cide sobre o diesel.
“Uma vez aprovado o projeto de reoneração da folha, nós iremos em seguida sair com um decreto eliminando a Cide incidente sobre o diesel”, disse Guardia.
O tributo rende cerca de 2,5 bilhões de reais por ano aos cofres federais, segundo o Ministério da Fazenda, que não soube informar quanto o governo arrecadará com o novo projeto de reoneração da folha.
A promessa de eliminação do tributo foi a segunda notícia positiva para os caminhoneiros autônomos nesta terça-feira, depois que a Petrobras anunciou no início da manhã que reduziria os preços de gasolina e diesel ao consumidor.
Os acenos do governo e da estatal, no entanto, não serão suficientes para evitar o terceiro dia de protestos, de acordo com o presidente da entidade que organiza o movimento dos caminhoneiros autônomos do país, a Abcam, José da Fonseca Lopes, e novos protestos devem ocorrer nesta quarta-feira.
A paralisação dos caminhoneiros, iniciada na véspera, já provoca transtornos e prejuízos na produção de carnes de aves e suína e de automóveis no país, de acordo com empresas. Para o governo, os impactos são pontuais, mas já afetam liberação de cargas de querosene de aviação, por exemplo.
O governo está “atento e sensível” ao problema dos caminhoneiros, que lidam com um forte aumento do diesel provocado pela valorização do dólar e alta do petróleo, segundo o ministro da Fazenda.
“Sabemos do impacto que o aumento do combustível tem na economia, o governo continuará a conversar principalmente com os caminhoneiros”, disse Guardia, acrescentando um “apelo” para que os motoristas retomem as atividades.
Sob pressão desde o início do dia pela redução dos combustíveis na bomba e por temores de que o governo modificaria a política de preços que permite o repasse direto ao consumidor das flutuações internacionais, a Petrobras reverteu as perdas do dia e passou a subir depois que Maia anunciou no Twitter que o governo zeraria a Cide.
O presidente da Câmara anunciou a medida pouco antes do comunicado feito pelo ministro da Fazenda. Do ponto de vista fiscal, a arrecadação que será perdida pela eliminação da Cide será compensada pela cobrança de tributos de alguns setores que hoje recebem o benefício da desoneração da folha, de acordo com Guardia (Reuters, 22/5/18)
Fecombustíveis diz que zerar Cide é pouco para reduzir preço
A Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis), que representa mais de 40 mil postos no Brasil, avalia que a decisão do governo de zerar a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) é insuficiente para reduzir os preços dos derivados de petróleo e propõe que sejam reduzidas também cobranças de PIS/Cofins nesses produtos.
Na avaliação da Fecombustíveis, a redução do PIS/Cofins, além da Cide zerada, seria uma forma de efetivamente reduzir os preços dos combustíveis, em meio a protestos por redução de tributos realizados por caminhoneiros em rodovias no país que estão afetando o transporte em mais de 20 Estados, com severo impacto ao setor agropecuário.
“Não resolve apenas zerar a Cide”, disse o presidente da Fecombustíveis, Paulo Miranda Soares, em entrevista à Reuters, ao comentar a decisão do governo federal.
“Se tirar somente a Cide, ela é insignificante, hoje ela representa 10 centavos por litro de gasolina e 5 centavos por litro de diesel”, comentou ele.
O ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, anunciou na noite desta terça-feira que o governo do presidente Michel Temer fechou um acordo com a cúpula do Congresso para usar os recursos obtidos com a reoneração da folha de pagamento de alguns setores para zerar a Cide sobre o óleo diesel.
“Se tirar 10 centavos, o consumidor não vai nem notar”, disse Soares, que revelou que terá uma reunião com o ministro de Minas e Energia, Moreira Franco, na quarta-feira, para apresentar sua proposta.
Soares disse que o setor está propondo que os valores do PIS/Cofins voltem ao que eram antes de uma forte elevação em meados do ano passado. Naquela oportunidade, em busca de melhorar suas contas, o governo subiu de 0,3816 real para 0,7925 real/litro o tributo sobre a gasolina e de 0,2480 real para 0,4615 real a taxa sobre o litro do diesel.
As reduções no PIS/Cofins e da Cide ainda teriam efeito sobre o ICMS, imposto estadual cobrado sobre o valor dos produtos antes dos postos, com uma redução adicional no valor dos combustíveis, afirmou o dirigente da Fecombustíveis.
“Aí os preços retornariam aos patamares do ano passado, seria uma redução mais expressiva, e acho que o governo não teria prejuízo”, comentou ele, citando uma menor arrecadação com impostos.
Soares disse que vai propor ainda que o governo convença a Petrobras de que os reajustes de preços de combustíveis sejam feitos quinzenalmente, e não diariamente, como vem ocorrendo desde meados do ano passado, quando a estatal mudou sua política para tentar recuperar mercado perdido para importadores.
Contudo, Soares disse que a política da Petrobras, de seguir as variações internacionais de petróleo e o câmbio, está correta.
“Não somos contrários à política de precificação, mas entendemos que a Petrobras não precisaria mexer diariamente”, disse ele, afirmando que entende a reivindicação dos motoristas de caminhão, que contratam o frete a um valor e depois se deparam com um diesel mais caro, na esteira dos preços do petróleo, perto dos maiores patamares desde 2014 (Reuters, 22/5/18)