23/03/2023

PCC gastou R$ 5 milhões para resgatar Marcola e atacar Moro; veja detalhes

O senador Sérgio Moro durante sessão no Senado; parlamentar era alvo do PCC, afirma PF. Foto: Adriano Machado/Reuters

SERGIO MORO Foto  Adriano Machado Reuters

 O senador Sérgio Moro durante sessão no Senado; parlamentar era alvo do PCC, afirma PF.

Fracasso da tentativa levou a ‘Sintonia Restrita’, o setor de operações especiais da facção, a pôr em funcionamento o plano B: o ataque ao senador e sua família

Era janeiro quando o promotor Lincoln Gakiya e o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Luiz Sarrubbo, desembarcaram em Brasília. Levavam na bagagem as informações bombásticas de uma testemunha protegida localizada pelo Grupo de Atuação Especial e Repressão ao Crime Organizado (Gaeco): o senador Sérgio Moro (União Brasil-PR), e sua mulher, a deputada federal Rosângela Moro (União Brasil-SP), e os dois filhos do casal estavam sendo seguidos pela Sintonia Restrita, o setor de operações especiais do PCC.

 

Havia seis meses que os bandidos comandados por Janeferson Aparecido Mariano, conhecido como Nefo ou NF, receberam a ordem para monitorar o alvo. Alugaram chácaras na região de Curitiba – em uma delas foi construída uma parede falsa em um dos cômodos para esconder armas e dinheiro. Nefo também alugou uma casa perto da residência dos Moro e uma sala comercial ao lado do escritório político do senador, em Curitiba. Os bandidos fotografaram o cotidiano do casal e de seus filhos. Escola, academia, compras e reuniões: tudo foi acompanhado pelos bandidos.

 

O grupo contava ainda com Reginaldo Oliveira de Sousa, o Rê, integrante da Sintonia Final dos 14, o grupo responsável pelas ordens aos faccionados em liberdade. Eles teriam providenciado carros blindados para a ação. Investigadores do caso desconfiam que toda a vigilância sobre a família Moro tinha como mais provável objetivo o sequestro do senador, da deputada e dos filhos, que seriam mantidos reféns em uma das chácaras, para obrigar o Estado a negociar a libertação de Marcola ou sua retirada do sistema penal federal.

“O resgate de Marcola é questão de honra para o PCC. Dinheiro tem de sobra”, afirmou o promotor Gakiya ao Estadão. Gakiya era outro dos alvos do plano do PCC, ao lado de agentes penitenciários e policiais de Mato Grosso do Sul e de Rondônia. O ataque às autoridades era o chamado Plano B da facção. Ele estava pronto para ser executado quando o promotor e Sarrubbo chegaram a Brasília. Além de informar a cúpula da PF sobre o caso, os dois também avisaram a Polícia Legislativa. Foi quando Moro e sua mulher souberam que eram o alvo dos bandidos e passaram a ser escoltados.

“Nós acreditamos que ele (o plano) só não foi posto em prática porque faltou a ordem do Marcola”, afirmou o promotor. Após o alerta dado pelo promotor, a PF passou a monitorar números de telefones e obteve quebras de sigilo para identificar os envolvidos na operação e localizá-los. Antes disso, há dois meses, um dos principais implicados na ação foi detido em São Paulo pelos homens das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota). Era Valter Lima Nascimento, o Guinho, outra liderança da Sintonia Restrita.

 

É Gakiya quem explica o que é a tal sintonia: “Eles são responsáveis apenas por assassinatos e resgates. Não se envolvem em outras atividades, exceto o tráfico de drogas.” Nefo e Ré foram presos nesta quarta-feira, 22, durante a Operação Sequaz, da PF. O primeiro estava na região de Campinas, no interior, e o segundo, na Baixada Santista, um das mais importantes rotas do Tomate, como é chamado o tráfico internacional de drogas da facção. Em nome de laranjas e familiares, Nefo teria um patrimônio que inclui lancha, carros importados e imóveis. “Coisa de milhões”, contou o promotor.

Os atentados contra autoridades como o ex-juiz Moro e o promotor era chamado de Plano B na facção porque o Plano A – o objetivo principal dos bandidos – era o resgate de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder da facção. Há mais de um ano, a inteligência do Departamento Penitenciário Federal (Depen) e a PF acompanhavam as movimentações e diálogos mantidos por Marcola e outros presos da facção na penitenciária federal de Brasília. O plano envolvia o treinamento de mercenários na Bolívia e arregimentação de integrantes do chamado Novo Cangaço para a invasão do presídio e resgate de Marcola.

Em razão da descoberta do plano, o Depen transferiu Marcola em março de 2022 para o presídio federal de Rondônia, onde a organização criminosa traçou um novo planejamento para a fuga de seu líder. Ao mesmo tempo, resolveu cobrar seus integrantes pelo fracasso da operação. Marcos Roberto de Almeida, o Tuta, que tinha recebido a missão de libertar o chefe foi sequestrado na Bolívia, em maio de 2022, e levado a um tribunal do crime. Desde então, está desaparecido.

A responsabilidade para soltar Marcola passara, então, para Guinho e, depois, para Nefo. Marcola permaneceu em Rondônia até janeiro deste ano, quando foi trazido de volta à Brasília, após a conclusão da construção de uma muralha no presídio federal. Foi só então que a cúpula da facção teria começado a discutir a execução do plano B. Mas era tarde. A ideia de apanhar Moro já havia chegado aos ouvidos do Ministério Público. Os investigadores do caso calcularam que a facção gastou cerca de R$ 5 milhões nos planos de resgate de Marcola – os Plano A e B.

Entenda a Operação Sequaz

A Operação Sequaz foi deflagrada pela Polícia Federal para desmantelar um plano que mirava o ex-juiz e agora senador Sérgio Moro (União Brasil-PR). A ofensiva ocorreu cerca de 45 dias após o início das investigações

Investigações

A PF foi acionada pelo Ministério Público de São Paulo, que identificou risco à segurança de Moro e também do promotor de Justiça Lincoln Gakiya. Mais de cem agentes foram às ruas cumprir 11 mandados de prisão em Mato Grosso do Sul, Rondônia, São Paulo e Paraná. O efetivo vasculhou 24 endereços

Histórico

Então ministro da Justiça e Segurança Pública, Moro coordenou a transferência e o isolamento de lideranças do PCC para presídios federais, entre eles Marcola. Já Lincoln Gakiya integra o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) e é responsável por investigações sobre a facção (O Estado de S.Paulo, 23/3/23)


PF frustra plano do PCC para assassinar autoridades

SERGIO MORO -Foto Marcelo Chello Zumapress picture alliance - DW

Polícia Federal faz operação contra suspeitos de planejar o sequestro e morte de agentes públicos. Sergio Moro era um dos alvos do grupo. Senador e sua família foram monitorados durante meses.

Polícia Federal (PF) realizou nesta quarta-feira (22/03) uma operação para contra membros da facção criminosa PCC suspeitos de planejar o assassinato e sequestro de autoridades, informou o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino. O ex-juiz e atual senador Sergio Moro era um dos alvos do grupo.

Batizada de Sequaz, a operação cumpriu 24 mandados de busca e apreensão e 11 de prisão no Paraná, São Paulo, Rondônia, Distrito Federal e Mato Grosso do Sul. Ao menos, nove suspeitos já foram presos e dois continuam foragidos. Também foram apreendidos uma moto e um carro, ambos da marca BMW no valor estimado de mais de R$ 500 mil, maços de dinheiro, relógios de luxo e colares de ouro.

Segundo a PF, o grupo "pretendia realizar ataques contra servidores públicos e autoridades, incluindo homicídios e extorsão mediante sequestro, em pelo menos cinco unidades da federação". A Polícia Federal apurou que os ataques poderiam ocorrer de forma simultânea.

Um dos alvos seria Sergio Moro, o que foi confirmado por sua assessoria. Moro, quando ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro, determinou a transferência de líderes do PCC para presídios de segurança máxima, numa tentativa de enfraquecer a organização.

A principal liderança do grupo, Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, foi transferido do sistema penitenciário estadual de São Paulo para a penitenciária federal em Brasília em fevereiro de 2019. Outros 21 membros da cúpula do PCC foram transportados em um avião das Forças Armadas para presídios federais a partir do aeroporto de Presidente Prudente.

Em 2020, Moro deixou o governo depois de romper com Bolsonaro e, em 2021, foi considerado parcial pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na condenação de Luiz Inácio Lula da Silva. No ano passado, ele foi eleito senador pelo Paraná.

Ataque em nível nacional

Entre os outros alvos do PCC estavam um comandante da Polícia Militar e Lincoln Gakyia, do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), de Presidente Prudente, que investiga a facção há 18 anos e vive há mais de dez sob escolta policial 24 horas por dia por causa das ameaças de morte recorrentes.

De acordo com os investigadores, os ataques vinham sendo planejados desde 2022. Um dos motivos seria uma portaria do governo federal que restringiu visitas íntimas nos presídios federais a partir de 2021.

Os criminosos alugaram chácaras, casas e um escritório ao lado de endereços do Moro, sendo que sua família também teria sido monitorada durante meses. Ao menos dez criminosos participavam do monitoramento da família do senador em Curitiba.

Segundo Dino, a intenção do grupo era realizar um ataque em nível nacional. "Foi investigado e identificado um plano de homicídios contra vários agentes públicos (dentre os quais um senador e um promotor de Justiça). Hoje [quarta-feira] a Polícia Federal está realizando prisões e buscas contra essa quadrilha. Meus cumprimentos às equipes da PF pelo importante trabalho", afirmou o ministro da Justiça.

Ao blog da jornalista Andréia Sadi, do G1, Moro disse que estava ciente das ameaças.

"Fui informado do risco", disse o senador.

Por essa razão, a Polícia Legislativa foi acionada para providenciar uma escolta.

Em postagem nas redes sociais, Moro disse que faria um pronunciamento no Senado a respeito do caso. "Por ora, agradeço a PF, PM/PR, Polícias legislativas do Senado e da Câmara, PM/SP, MPE/SP, e aos seus dirigentes pelo apoio e trabalho realizado", escreveu.

O PCC atua dentro e fora dos presídios brasileiros e também em outros países (DW, 22/3/23)