03/10/2023

Petrobras chega aos 70 atrasada em renováveis e com restrições ao petróleo

Petrobras chega aos 70 atrasada em renováveis e com restrições ao petróleo

Logo da Petrobras no edifício sede da companhia, no centro do Rio de Janeiro. Foto Reuters

 

Em sete décadas, empresa cumpriu papel de tornar país autossuficiente, mas enfrenta desafios futuros.

Maior estatal brasileira, a Petrobras chega aos 70 anos como uma das maiores produtoras de petróleo do mundo, mas com grandes desafios pela frente, atrasada na corrida rumo à transição energética e enfrentando restrições para expandir suas reservas de petróleo.

Criada em 3 de outubro de 1953 para garantir o suprimento nacional de petróleo, a companhia cumpriu sua missão inicial, principalmente após a descoberta do pré-sal há 15 anos, que elevou o Brasil ao posto de grande exportador de petróleo, hoje um dos destaques da balança comercial do país.

Em 2022, o setor teve superávit comercial de US$ 20,6 bilhões, o maior desde que o país passou a exportar mais do que importar, em 2016. A dependência externa de combustíveis, principalmente diesel, ainda é um problema, mas compensado pelas exportações de óleo do pré-sal.

Um tipo de petróleo que, segundo especialistas do setor, resistirá às maiores restrições contra a emissão de gases poluentes, por conter baixos níveis de enxofre e pela elevada produtividade dos reservatórios, o que faz da Petrobras uma das petroleiras com menores índices de emissões.

Mas, embora ainda com 13 novas plataformas planejadas até 2027, a Petrobras já vê o pico de produção do pré-sal no fim desta década, com o início de uma curva de declínio nos anos seguintes. E enfrenta cada vez mais dificuldades para renovar suas reservas no país.

Sua principal aposta está nas bacias da Margem Equatorial brasileira, alvo de embate com a área ambiental do governo: dois dos três pedidos de licença para região já tiveram pareceres negativos do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis).

Nesta segunda (2), o Ibama autorizou a perfuração de poços na Bacia Potiguar, uma das cinco da Margem equatorial, mas ainda é grande a resistência para autorizar a atividade em áreas consideradas mais promissoras, como as bacias da Foz do Amazonas e Barreirinhas.

Em parecer de 2021 sobre pedido para perfuração nesta última, em frente ao Maranhão, o Ibama disse que a atividade é inviável na região.

A Petrobras ainda tenta obter as licenças e defende que a exploração da região é importante para compensar o declínio da produção do pré-sal.

"Se o Estado brasileiro por algum motivo decidir que não vai dar, terá que ser peremptório. Se for peremptório e disser que não vai dar, acabou. Mas isso ainda não aconteceu", disse o presidente da estatal, Jean Paul Prates, na quinta-feira (27).

Ele afirmou esperar autorização do Ibama para um poço nas próximas semanas. É mais provável, porém, que o órgão ambiental aprove inicialmente a exploração na costa do Ceará, área considerada com menos potencial do que as outras bacias da Margem Equatorial.

O setor defende que o petróleo brasileiro ainda terá espaço no mercado por muito tempo, por ter menos emissões do que a produção de outros países.

"Nós vamos deslocar a produção de outros países nesse movimento de transição energética", diz Roberto Ardenghy, que foi diretor da estatal e hoje preside o IBP (Instituto Brasileiro do Petróleo e Gás).

Ardenghy alega que a receita com o petróleo é fundamental para que a Petrobras assuma sua nova missão de encontrar economicidade para novas tecnologias de geração de energia limpa. "É uma estratégia conjunta, na qual mantém o petróleo, porque ele é que te dá a sustentação econômica."

A estatal ficou atrasada em relação a seus pares globais, principalmente os europeus, no segmento de energias renováveis. Se desfez, nos últimos governos, das participações que tinha em parques eólicos e deixou em segundo plano seu negócio de biocombustíveis.

"A Petrobras andou na contramão das grandes petroleiras, que avançaram, em diferentes velocidades, em projetos renováveis ou novas rotas tecnológicas", diz o Para o pesquisador do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos em Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), Mahatma dos Santos.

O último plano de negócios aprovado pelo governo Jair Bolsonaro, por exemplo, separou apenas 6% do orçamento para os próximos cinco anos a investimentos ambientais. Deste total, 84% seriam destinados a projetos de descarbonização das atividades e só 16% em novas tecnologias de combustíveis e energia.

Mesmo elevando o foco em petróleo após a guerra na Ucrânia, as maiores petroleiras da Europa alocam percentuais bem superiores. Em seu plano estratégico para o período entre 2023 e 2028, a Shell, por exemplo, prevê 20% do orçamento para projetos de baixo carbono.

A nova gestão da empresa já anunciou plano para ampliar essa fatia a até 15%. Em setembro, assinou acordo com a fabricante de turbinas WEG para o desenvolvimento de tecnologias e disse que pedirá ao Ibama licenciamento de dez áreas marítimas para a geração de energia eólica.

Esse segmento, porém, ainda precisa de regulamentação e só deve começar a apresentar resultados no longo prazo, assim como apostas em hidrogênio verde e combustíveis sintéticos, outras tecnologias ainda em estágio de viabilização.

Para o curto prazo, a empresa foca na produção do chamado diesel verde, produzido com matéria-prima vegetal. O plano estratégico de 2022 separou US$ 600 milhões para a produção desse combustível em quatro refinarias e a expectativa é que o negócio ganhe mais corpo com o apoio da nova lei dos combustíveis do futuro.

Prates reconhece o atraso, mas diz que a empresa começou a agir. "Já estamos tirando o atraso muito bem, ao longo de seis, sete meses de gestão. Mais para a frente, a gente vai ser mais incisivo ainda."

Segundo ele, todas as tecnologias estão no radar. "Algumas coisas já saíram do papel", afirmou, citando o desejo de investir em eólicas no mar e o diesel verde (Folha, 3/10/23)