Plantando o futuro – Por Roberto Rodrigues
O ano de 2019 termina com um saldo positivo para o agronegócio brasileiro.
Vai terminando o ano de 2019 com um saldo positivo para o agronegócio brasileiro, bem como para o País. Tudo indica que o PIB nacional crescerá cerca de 1,2% e o do agro, 3%. A participação do agro no PIB total vai se manter na faixa da última década, em torno de 22% a 23%.
Mais uma vez houve recorde na produção de grãos, com uma colheita de 242 milhões de toneladas. Embora seja muito cedo para estimar a colheita de 2020, por causa da incerteza quanto ao clima, ela pode chegar a 246 milhões de toneladas.
Com as carnes houve um outro fator, a eclosão da peste suína africana na China e países vizinhos, que levou ao sacrifício de milhões de matrizes naquela região, gerando uma explosiva demanda por outras carnes. Este fato estimulou o aumento da criação de frangos e suínos aqui, que já vinha subindo: entre 2009 e 2019, a produção de aves aumentou 24%, a de porcos outros 27% e até a de gado bovino cresceu 14%, com seu ciclo mais longo. E houve melhor remuneração aos produtores, influindo também na valorização dos grãos.
O mesmo avanço não aconteceu com a cana-de-açúcar. Só houve um pequeno crescimento da safra 2009/10 (605 milhões de toneladas) para a atual, de 620 milhões. Produzimos em 2018/19 cerca de 30,95 bilhões de litros de etanol de cana e deveremos chegar a 33,1 bilhões na safra 2019/20. Vale ressaltar que a cana-de-açúcar já representa 17% da nossa matriz energética (mais que toda a energia gerada nas nossas hidrelétricas), graças ao etanol, mas principalmente à produção de eletricidade a partir do bagaço e da palha. E vem crescendo o álcool de milho, com novas unidades industriais em construção, sobretudo no Centro-Oeste. A entrada em vigor do RenovaBio sinaliza uma retomada expressiva desse importante setor do nosso agronegócio.
Já a produção total de café (arábica e conilon) teve um aumento razoável nos dez anos recentes: de 39,4 milhões de sacas em 2009/10 para quase 49 milhões este ano, mas preços muito baixos nos últimos anos desestimularam a adoção de insumos modernos.
Citricultura é um setor que vem sofrendo com a competição acirrada com outros sucos e novas bebidas, tendo diminuído o volume de produção: de 2009 ao ano passado (a safra atual ainda está em andamento), caiu de 218,9 milhões para 208,4 milhões de toneladas.
A produção de leite cresceu de 19,6 bilhões de litros, em 2009, para 24,33 em 2018, devendo superar esse volume neste ano. Vem aumentando a produção de madeira e celulose, a de algodão, frutas, flores e hortifrutigranjeiros e orgânicos.
E a demanda crescente de alimentos e fibras por parte dos países emergentes também explica a posição notável do Brasil no comércio global de produtos agrícolas. Somos o maior exportador mundial de café, suco de laranja, açúcar, do complexo soja (grão, farelo e óleo), de carne bovina e de carne de frangos. Somos o segundo maior exportador de milho, o quarto de carne suína, e crescendo em diversos outros produtos. Mas ainda há um enorme espaço a ocupar em fruticultura, em laticínios, em peixe, em flores, algodão, madeira e outros grãos (arroz, feijão, sorgo, amendoim, etc.). E também podemos crescer em novos mercados.
Naturalmente, isso depende de uma ampla estratégia que contemple investimentos em logística, que alcance acordos comerciais bi ou multilaterais (como o importantíssimo acordo sinalizado entre União Europeia e Mercosul, que nos traz de volta ao grande tabuleiro do comércio global), que garanta estabilidade da renda ao produtor (seguro rural), de investimentos em inovação e P&D, que trate com a maior seriedade a questão da defesa sanitária animal e vegetal, que contemple a segurança no campo, que reformule legislações obsoletas e assim por diante.
Boa parte dessas questões pressupõe políticas públicas adequadas, e estas vêm acontecendo, com a visão moderna da excelente ministra da Agricultura, Tereza Cristina, com o apoio da equipe econômica.
Há uma retomada, ainda tímida, tanto do crescimento econômico quanto do emprego. Isso, somado à taxa de juros mais baixa da história e à inflação também controlada, cria uma expectativa otimista e de confiança entre empresários e investidores.
O comportamento do Congresso Nacional anima, a partir da reforma da Previdência e anúncios de outras, como a tributária e a política.
Para o setor rural, a MP do Agro deverá trazer novos recursos para o campo, reduzindo a demanda de garantias reais para acesso ao crédito e aumentando a participação de bancos privados no segmento. Por fim, a participação das cooperativas agropecuárias no PIB do agronegócio já passa de 50%, avançando graças ao trabalho do Sistema OCB, que vem investindo em gestão e governança das cooperativas.
Em suma, há um cenário de esperanças no ar. Alguma coisa pode atrapalhar isso? Bom, sempre tem a incerteza climática... Também há a insegurança quanto à negociação entre EUA e China, e o sempre volátil câmbio.
Mas os produtores rurais brasileiros estão cada vez mais resilientes quanto a tudo isso, confiam em si e no País e continuarão plantando o futuro (Roberto Rodrigues é ex-ministro da Agricultura e coordenador do Centro de Agronegócio da FGV; O Estado de S.Paulo, 29/12/19)