05/05/2023

Política industrial: Digital, humana, sustentável e realista

Política industrial: Digital, humana, sustentável e realista

Política industrial- Digital, humana, sustentável e realista-Imagem Blog Colorado SA

 

Por Heloisa Menezes e Rodrigo R. Loures

 

Como deve ser a nova política industrial e tecnológia do País, a fim de aumentar nossa produtividade, um dos principais gargalos do Brasil no ambiente competitivo global.

A busca da competitividade das empresas e das nações na era digital não prescinde de fatores tradicionais e estruturantes como ambiente de negócios, estrutura tributária e infraestruturas físicas favoráveis, pessoas preparadas e capital produtivo eficiente. Entretanto, a atividade industrial, incluída a cadeia do agronegócio, requer novos estímulos para o aumento significativo e rápido de produtividade, um dos principais gargalos do Brasil no ambiente competitivo internacional. Tomando como referência a produtividade do trabalhador norte-americano, são necessários quatro trabalhadores brasileiros para gerar o mesmo valor.

Neste contexto, a questão central é: como elevar os padrões de produtividade pela valorização dos recursos existentes (naturais, humanos e culturais, produtivos e tecnológicos) e do parque industrial já instalado no País, composto por empresas de todos os portes e níveis de maturidade?

A nova política industrial e tecnológica deve focar na modernização e transformação digital da indústria do País e na diversificação da sua produção, em setores e cadeias das quais já participamos com vantagens comparativas do jogo internacional, como mineração e óleo & gás, alimentos e produtos florestais, como celulose e produtos da bioeconomia.

 

Modernizar a indústria implica a sua efetiva entrada na era digital, com a incorporação de tecnologias da indústria 4.0 em todas as etapas de sua cadeia de valor e a adoção de estratégias e modelos de negócios que considerem a indústria como parte de um ecossistema. Tal visão permite, inclusive, a inserção de pequenas e médias empresas em plataformas que assegurem ganhos coletivos, num contexto desafiador de crescente concentração econômica nas mãos de empresas-plataforma.

Tal movimento, para escalar e gerar aumento geral da produtividade do trabalho e do capital, requer não somente ajustes macroeconômicos e no ambiente de negócios, mas, em especial, ação de política industrial que apoie a transformação microeconômica, baseada no digital, das médias e pequenas empresas.

Política industrial e tecnológica que vise a P&D para inovações disruptivas e de novos produtos orientados por missões, mas que também facilite a extensão e transferência tecnológica de inovações já desenvolvidas, para o aumento da resiliência e eficiência das empresas a menor custo, fundamental para a sobrevivência num mundo repleto de incertezas.

A outra face da nova política industrial e tecnológica, a diversificação da produção, significa servicificar a indústria, permitindo que ela entre, de maneira competitiva, em elos que agreguem mais valor ao produto, como a logística 4.0 e serviços de manutenção sofisticados, o que em grande parte das vezes exige novo posicionamento de marca e de relacionamento com o cliente. Tal movimento requer maiores investimentos em intangíveis e levará, como consequência, a maiores ganhos de produtividade.

 

Estudos da McKinsey demonstram que as empresas que mais investem em variados ativos intangíveis e que os implantam para desenvolver novas capacidades, como atingir novos mercados, são as que mais crescem e são mais produtivas.

 

Evidência reforçada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): um aumento de 10 pontos porcentuais na taxa de adoção em todo o setor industrial da tecnologia de computação em nuvem está associado a um crescimento de produtividade de 3,5% em empresas europeias médias, após cinco anos.

 

A nova política industrial brasileira deve ser orientada por missões estratégicas de país, considerando, prioritariamente, as oportunidades que as questões energética, climática e de segurança alimentar impõem ao mundo como desafios. Deve ser instrumento para a construção de uma nova matriz econômica, baseada na inovação e na descarbonização das atividades produtivas nas cidades e no campo, a partir da qual o Brasil possa oferecer ao mundo créditos de carbono, alimentos e energia limpos, rastreáveis e abundantes.

Por fim, o Brasil detém uma base industrial e de conhecimento científico e tecnológico diversa e desconcentrada regionalmente. Nosso grande e rico país nos oferece diversificadas fontes de energia limpa e riquezas potenciais para o desenvolvimento de uma bioeconomia relevante, que tem de ser escalada a partir do fomento à indústria nas regiões, respeitando e potencializando o desenvolvimento humano, social e a biodiversidade existentes e potenciais. Tudo com rastreabilidade que garanta o respeito à biodiversidade e ao ser humano.

Assim, a nova política industrial e tecnológica baseada na riqueza energética, das florestas e dos alimentos, será uma política de estímulo ao desenvolvimento de clusters produtivos inovativos, em que atuam de maneira integrada e complementar grandes corporações, médias, pequenas empresas e startups, construindo e absorvendo o conhecimento especializado e aplicado das universidades e dos centros de pesquisa. O fomento a labs de inovação em tecnologias de descarbonização e rastreabilidade pode ser um bom início (Heloisa Menezes e Rodrigo R. Loures são, respectivamente, economista, professora da Fundação Dom Cabral, ex-secretária de Desenvolvimento da Produção do MDIC,  ex-diretora do Sebrae e fundador da Nutrimental e ex-presidente da Federação das Indústrias do Paraná – FIEP; O Estado de S.Paulo, 5/5/23)