09/09/2024

Preços do leilão de energia do Paraguai ficam longe do mínimo de US$ 49,83

Preços do leilão de energia do Paraguai ficam longe do mínimo de US$ 49,83

Escoamento de excedente de água em Itaipu - Sara Cheida-Itaipu Binacional

 

Esse seria o valor para eventual 'venda contábil' sugerida pelo país vizinho, segundo estimativa da Frente Nacional de Consumidores.

Simulações feitas pela Frente Nacional de Consumidores de Energia, e obtidas em primeira mão pela Folha, apontam que o Paraguai teria de comercializar a energia no mercado livre do Brasil acima de US$ 49,83 pelo MWh (R$ 277,53 pelo megawatt-hora), caso queira realizar a sugerida "venda contábil" utilizando a energia de Itaipu, sem perder dinheiro.

No final de julho, o Paraguai realizou um leilão para vender 100 MW médios de sua energia no Brasil, sem explicar como entregaria e sem que os trâmites regulatórios fossem concluídos. Nesta sexta-feira (6), a Ande (estatal paraguaia responsável pelo leilão e também pela energia de Itaipu no país vizinho) divulgou a lista de sete comercializadores que foram habilitados naquele leilão, sem deixar claro se já escolheu o vencedor. Os valores ficaram muito abaixo do piso estimado pela Frente de Consumidores (veja lista abaixo).

Folha enviou mensagem solicitando mais esclarecimentos ao diretor de Planejamento da Ande, Francisco Escudero, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

Apesar de o ONS (Operador Nacional do Sistema) sinalizar a possibilidade de a importação ser física, com a energia indo do Paraguai para o Brasil pela conexão de Furnas, a Frente mantém o entendimento de restrição técnica para essa alternativa. Segundo a entidade, ainda que fossem feitos os ajustes regulatórios para o Paraguai utilizar a energia de Itaipu nessa operação, a conta não fecharia.

"Se custar menos que esses cerca de US$ 50 numa operação envolvendo Itaipu, significa que o Paraguai venderia energia duplicada, ou seja, que já foi paga pelo brasileiro", afirma Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente.

Para entender o valor apresentado pela entidade, é preciso assimilar como se faz a divisão do bolo financeiro na usina binacional.

As operações em Itaipu são feitas com base na potência, que é a capacidade de geração da energia considerando os equipamentos instalados, medida em megawatt. Cada sócio arca com o custo da quantidade de potência que consome e divide os demais custos operacionais e regulatórios, como pagamento de royalties. A base para a contabilização dessa conta é o Cuse (Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade).

Pelo tratado, a energia e demais despesas de Itaipu são divididas meio a meio entre os dois países sócios. Se um lado não conseguir consumir todos os seus 50%, obrigatoriamente, a fatia que sobra fica para o outro parceiro. É proibido vender diretamente para terceiros.

Desde o início da operação de Itaipu, o Paraguai não consome tudo e cede sua sobra para o Brasil. Nessa operação, os brasileiros pagam o Cuse da parcela que o país vizinho não consome, e ainda desembolsam um bônus pelo uso dessa energia cedida, que tecnicamente é chamada de energia excedente do Paraguai.

Pelas contas da Frente, em valores correntes, atualmente, quando o Paraguai cede para o Brasil um volume de 100 MW médios, ele deixa de pagar US$ 32,79 milhões (R$ 182,63 milhões) referentes ao Cuse, que o Brasil paga no seu lugar, e ainda ganha dos brasileiros US$ 10,86 milhões (R$ 60,48 milhões), pela cessão de energia.

Se quiser usar a energia de Itaipu para vender 100 MW médios no mercado livre do Brasil, não basta que o Paraguai suspenda a cessão do excedente de energia para o Brasil. Precisa, ao mesmo tempo, assumir o pagamento do Cuse referente a esse volume de energia.

Convertendo para MWh, que mede fluxo de energia, e é a métrica adotada nas transações: o Paraguai precisa garantir que vai receber no mercado livre brasileiro US$ 12,40 (R$ 69,06) por MWh para cobrir o que ganha do Brasil pelo excedente, e ainda receber outros US$ 37,43 (R$ 208,47) por MWh para quitar a parcela referente ao Cuse. Por isso o MWh chegaria ao mercado livre por, no mínimo, US$ 49,83 —o que não foi conseguido no leilão.

A proposta de usar energia de Itaipu não é uma simulação da Frente. Foi sugerida a comercializadores em evento da Ande no Paraguai e explicada à Folha, em troca de mensagem da reportagem com o diretor de planejamento da estatal paraguaia, realizada em julho.

"Como o Paraguai transfere boa parte de seu direito [de uso da energia] em Itaipu Binacional [para o Brasil], serão deduzidos dessa transferência os 100 MW médios vendidos pela Ande ao agente comercializador do ACL [Ambiente de Contratação Livre] que for adjudicado na competição de preços. Isso [a possibilidade] existe e consta na ata do conselho de administração da binacional Itaipu. Deve ser regulamentado e operacionalizado pelo MME do Brasil, que está trabalhando nisso", escreveu Escudero à Folha.

VALORES OFERECIDOS PELA ENERGIA DO PARAGUAI

  1. Enel Trading Brasil
    US$ 10,11 por MWh, de 1º de janeiro de 2025 a 31 de dezembro de 2026
    R$ 56,30 por MWh
  2. Matrix Comercializadora
    US$ 12 por MWh, por até três anos, com mínimo de um ano
    R$ 66,83 por MWh
  3. Infinity
    US$ 21,03 por MWh, por seis anos
    R$ 117,12 por MWh
  4. Âmbar
    US$ 10,33 por MWh, por seis anos
    R$ 57,53 por MWh
  5. Engelhart – BTG Commodities
    US$ 7,73 por MWh, por três anos
    R$ 43 por MWh

    6. Kroma
    US$ 8,68 por MWh, por seis anos
    R$ 48,34 por MWh
  6. Vitol Power Brasil
    US$ 8,66 por MWh, de 1º de janeiro de 2025 a 31 de dezembro de 2030
    R$ 48,23 por MWh (Folha, 7/9/24)