Previdência: Proposta prevê idade mínima de 65 anos para homem e mulher
Legenda: Cerimônia de posse da nova composição da Câmara dos Deputados no dia 1º de fevereiro de 2019
Proposta preparada pela equipe econômica, e que terá de passar pelo crivo do presidente Jair Bolsonaro, prevê medidas duras para se chegar a uma economia de R$ 1,3 trilhão em dez anos, mas membros do próprio governo já manifestaram dúvidas.
O projeto de reforma da Previdência elaborado pela equipe econômica, e que será apresentado ao presidente Jair Bolsonaro, prevê idade mínima de 65 anos para homens e mulheres se aposentarem. O dado consta da minuta preliminar da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) obtida pelo Broadcast, sistema de informação em tempo real do Grupo Estado. A nova idade valeria depois de um período de transição que pode chegar a 19 anos.
O texto da proposta, que já passou pelo crivo da área jurídica do governo e foi confirmado por três fontes que participam da elaboração da reforma, é robusto e faz uma ampla mudança nas regras atuais, como prometeu o ministro da Economia, Paulo Guedes, para garantir uma economia de até R$ 1,3 trilhão em 10 anos nas despesas do governo. Mas ainda terá de passar pelo crivo do presidente Bolsonaro.
O secretário especial de Previdência Social, Rogério Marinho, confirmou que a minuta é realmente do governo, mas afirmou que há outras simulações sendo feitas pelos técnicos. A reportagem apurou, no entanto, que o texto já foi discutido na última sexta-feira pelo governo. “São várias propostas. A minuta que chegou ao conhecimento da imprensa é apenas mais um entre os textos analisados”, afirmou Marinho em um pronunciamento à imprensa de menos de três minutos.
O texto, antecipado no meio da tarde desta segunda-feira, 4, pelo Broadcast e pelo portal do Estadão, foi bem-recebido pelo mercado financeiro, que classificou a proposta de “hardcore”. Ou seja, dura e comprometida com o ajuste das contas públicas. “Tem muito mais aí do que se esperava inicialmente. Porém, a pergunta que se faz é: a partir dessa minuta, o que vai sobrar?”, disse o economista-chefe do banco ABC Brasil, Luís Otávio de Souza Leal. Na esteira dos detalhes da proposta, a Bolsa bateu novo recorde e alcançou 98.588 mil pontos.
A proposta de igualar a idade mínima de homens e mulheres para a aposentadoria é um dos temas mais polêmicos da reforma e já provocou reação de integrantes do governo e parlamentares que vão votar o projeto. Depois da divulgação do conteúdo da proposta, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, se adiantou e disse que o presidente Bolsonaro é contra a ideia de igualar a idade mínima para a aposentadoria. “Os números estão inflados. O presidente não é favorável a igualar a idade mínima entre homens e mulheres. Concordo com ele”, disse o vice-presidente.
Parlamentares ouvidos pela reportagem acreditam que o governo quer ter margem de negociação com o Congresso e, por isso, estabeleceu um limite alto de idade. A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, disse ver com preocupação a questão, principalmente para as trabalhadoras rurais.
Gatilho
A proposta de reforma da Previdência prevê também um mecanismo de ajuste na idade mínima conforme a elevação da expectativa de vida dos brasileiros. A ideia é que o ajuste seja feito a cada quatro anos, conforme aumente a expectativa de sobrevida da população brasileira aos 65 anos.
Para evitar reações contrárias antes de o novo texto ser apresentada na Câmara, o governo havia traçado uma estratégia de comunicação de contenção de vazamentos. A divulgação do texto acabou provocando mal-estar na equipe e preocupação de a proposta ser bombardeada antes da hora.
Capitalização
O governo vai incluir na PEC a previsão de criação do sistema de capitalização para a Previdência Social, mas vai deixar a regulamentação para ser feita depois por meio de projeto de lei. O modelo, pelo qual as contribuições vão para uma conta individual, terá caráter obrigatório, dependendo do nível de renda.
Os trabalhadores poderão usar parte do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para complementar a contribuição, sem prejuízo de outras fontes adicionais de contribuições de empregados e do trabalhador, pelo texto da minuta da PEC obtida pelo Broadcast.
A capitalização é um dos pontos polêmicos da reforma da Previdência, mas conta com o apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Em entrevista após a sua reeleição, Maia chegou a prever que a capitalização “passa fácil” na Casa. Mas essa é uma proposta que só vai valer para quem ainda vai entrar no mercado de trabalho, em data ainda a ser definida.
Para conter as resistências, o governo decidiu incluir na PEC apenas a previsão legal para a capitalização, sem fixar um prazo para que a regulamentação seja feita. A medida dá tempo para o governo trabalhar numa proposta. A estratégia será mostrar também que o modelo de capitalização será diferente do chileno, que passa por revisão depois que as aposentadorias ficaram menores do que a renda prevista inicialmente.
Pelo texto da PEC, será vedada a transferência de recursos públicos para esse novo sistema. A gestão desse novo sistema será feita por entidades de previdência públicas e privadas. O trabalhador poderá escolher a entidade que vai gerir esses recursos e poderá optar pela portabilidade a qualquer momento sem nenhum custo. O governo não poderá usar esses recursos.
A capitalização será pelo regime de contribuição definida. Isso significa que o valor da contribuição é acertado no ato da contratação do plano e o benefício que será recebido no futuro varia em função do valor das contribuições, do tempo em que foram feitas e da rentabilidade dos recursos
Rombo dos servidores
A minuta da reforma da Previdência que será enviada pelo governo ao Congresso não vai mais permitir que o Tesouro banque o déficit da aposentadoria de funcionários públicos. União, Estados e municípios terão dois anos para montar um plano para equacionar o déficit público.
Para assegurar recursos para o pagamento de aposentadorias e pensões para servidores e dependentes, cada ente federativo deverá criar, por meio de lei, fundos previdenciários de natureza privada.
Em caso de déficit atuarial, deverão ser instituídos, por meio de lei, em adição às contribuições, "planos de saldamento do déficit" com contribuições extraordinárias paritárias entre o ente federativo e os servidores ativos, aposentados e pensionistas.
Essas contribuições extraordinárias deverão considerar as condições dos servidores ativos, aposentados ou pensionistas, o histórico contributivo e a regra de cálculo do benefício recebido. No caso de aposentados e pensionistas, a alíquota extraordinária incidirá sobre a parcela acima do salário mínimo.
A PEC prevê ainda que a contribuição regular dos servidores terá alíquota não inferior à cobrada no INSS, mas poderá ser adotada uma alíquota progressiva, de acordo com o valor da remuneração ou do benefício (O Estado de S.Paulo, 5/2/19)
40 anos de contribuição para ter direito a 100% da aposentadoria
Legenda: Atualmente, há duas formas de se aposentar: por idade ou por tempo de contribuição
Segundo proposta preliminar da reforma obtida pelo 'Estado', 20 anos de contribuição ao INSS darão direito a 60% do benefício.
Os brasileiros que ganham acima de um salário mínimo precisarão contribuir por 40 anos para conseguir se aposentar com 100% do salário de contribuição (cujo teto hoje é de R$ 5,839 mil), segundo a minuta da proposta de reforma da Previdência obtida pelo Broadcast, que foi preparada pela equipe econômica e será apresentada ao presidente Jair Bolsonaro. Para quem ganha o piso, nada muda, uma vez que o texto proíbe o pagamento de qualquer aposentadoria abaixo de um salário mínimo. Mesmo assim, essa regra deve ser um dos focos de resistência dos parlamentares durante a tramitação no Congresso Nacional.
Pela minuta, os segurados que ganham mais de um salário mínimo vão ter direito a 60% do benefício ao completar 20 anos de contribuição – que passaria a ser o tempo mínimo de contribuição, hoje em 15 anos. A cada ano adicional, são conquistados mais 2 pontos porcentuais. Por exemplo, quem conseguir ficar 35 anos recolhendo para a Previdência vai receber 90% do salário de contribuição.
A regra vale tanto para o INSS quanto para o regime dos servidores públicos, embora o tempo mínimo de contribuição a ser exigido seja diferente. Enquanto no INSS será de 20 anos, para o funcionalismo seria de 25 anos. Para professores, que, pela proposta, seriam contemplados com idade mínima menor (60 anos), a exigência seria de 30 anos de contribuição.
Transição
Nos cinco anos seguintes à aprovação da reforma, ainda será possível se aposentar por tempo de contribuição (35 anos para homens e 30 anos para mulheres, como hoje) sem nenhum outro tipo de exigência. Mas o segurado ficará sujeito ao fator previdenciário – um cálculo que leva em conta idade e tempo de contribuição e acaba reduzindo o valor do benefício. Isso dá poder de escolha ao trabalhador que já estiver muito próximo da aposentadoria.
Os trabalhadores também poderão – mesmo após esses cinco anos – optar por uma regra de transição, que adapta a fórmula “85/95” usada hoje no cálculo dos benefícios. A ideia é que os segurados do INSS e os servidores públicos precisem, já em 2019, completar 86 pontos (mulheres) e 96 pontos (homens) considerando a soma entre idade e tempo de contribuição. O nível 86/96 está em vigor hoje, e dá direito ao benefício integral. Mas, na nova regra, também incidiria sobre ele o fator previdenciário. Ou seja, o benefício não seria mais integral.
Segundo o texto, a regra 86/96 sobe um ponto a cada ano, até o limite de 105 pontos. Isso significa uma transição de nove anos para homens e de 19 anos para mulheres.
A proposta de reforma da Previdência original do governo Michel Temer previa um tempo de contribuição ainda maior, de 49 anos, para se conseguir o benefício integral. A medida foi mal recebida no Congresso, e a exigência acabou sendo derrubada também para 40 anos (O Estado de S.Paulo, 5/2/19)
Proposta de reforma prevê criação de contribuição à Previdência para militares
Legenda: Equipe econômica quer criar uma alíquota previdenciária para os militares
Medida representa uma guinada no tratamento dos militares, que hoje pagam 7,5% para financiar o pagamento de pensões.
A equipe econômica do governo quer criar uma alíquota previdenciária para os militares, que não poderá ser menor que a cobrada no INSS (que hoje vai e 8% a 11%), segundo minuta do texto da reforma da Previdência obtida pelo Broadcast. Pela proposta, eles ainda estarão sujeitos ao pagamento de alíquotas complementares, a serem instituídas para equacionar o rombo no regime da categoria, que ficou em R$ 43,9 bilhões no ano passado.
A medida representa uma guinada no tratamento dos militares, que hoje pagam 7,5% para financiar o pagamento de pensões. Pela proposta, essas alíquotas poderão inclusive ser cobradas de militares da reserva ou que foram reformados. Há a possibilidade ainda de instituir contribuições progressivas, conforme a remuneração.
A equipe econômica também propõe equiparar as regras das Forças Armadas para os policiais militares. A vinculação é uma demanda dos governadores, que articulam uma frente pró-reforma. Os militares nos Estados contam hoje com uma série de regras especiais para a aposentadoria e representam uma fatia significativa do déficit.
Na semana passada, integrantes da equipe econômica discutiram a inclusão dos militares em almoço com o vice-presidente, Hamilton Mourão, e os ministros da Defesa, Fernando Azevedo, da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, e com os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem insistido com o presidente Jair Bolsonaro a necessidade de incluir os militares na reforma para facilitar a aprovação no Congresso ao transmitir a mensagem de que todos darão sua contribuição.
O texto prevê ainda que os militares da reserva poderão exercer atividades civis em qualquer órgão do ente mediante gratificação ou abono, mas esse tempo não poderá ser contabilizado para aumentar seu benefício. Isso significa que um militar da reserva das Forças Armadas poderá trabalhar em outro órgão da União, e um policial militar já aposentado poderá exercer atividade em outro órgão do mesmo Estado que o empregou (O Estado de S.Paulo, 5/2/19)