Primeiros cem dias de Bolsonaro desafiam agro a contornar viés ideológico
Legenda: Descarregamento de soja brasileira no porto de Nantong, na China; asiáticos fica com 76% do exportado
Atuação de lideranças do setor evita, no entanto, maiores estragos na balança comercial.
Nestes primeiros cem dias de governo, o agronegócio vem sendo constantemente chamuscado pelos disparos verbais do presidente da República, Jair Bolsonaro.
Mais de uma vez, o setor sofreu as consequências de discussões laterais, como a possibilidade de mudança da embaixada brasileira de Israel para a cidade de Jerusalém ou o temor da presença chinesa na economia brasileira.
A carga ideológica que vem dominando o novo governo colocou em alerta vários países de peso nas importações de produtos brasileiros.
Atritos comerciais drásticos só não ocorreram porque o próprio setor do agronegócio, grande apoiador do presidente, o advertiu dos riscos, fazendo-o sempre voltar atrás.
Uma da primeiras discussões tratou de uma possível extinção do Ministério do Meio Ambiente, o que gerou preocupação entre os europeus, para quem as regras de sustentabilidade na produção são cada vez mais uma exigência.
As normas ambientais dos europeus são motivo de discussão entre os produtores brasileiros, mas não se pode pôr em risco a relação comercial com a Europa.
Neste primeiro trimestre, os europeus compraram o correspondente a US$ 3,8 bilhões do Brasil em produtos do agronegócio e foram responsáveis por 19% dos US$ 19,9 bilhões que o país exportou, conforme dados da Secex (Secretaria de Comércio Exterior).
Outra ameaça de atrito que o presidente teve de amenizar foi o fato de ter acusado a China, durante a campanha eleitoral, de estar comprando o Brasil. Os chineses ficaram com 33% do que o Brasil exporta no setor do agronegócio de janeiro a março último. Eles gastaram US$ 6,6 bilhões nesse setor no país.
Líderes na compra de soja brasileira —eles levam 76% do que o Brasil exporta—, os chineses ganham importância também nas carnes. Ficaram com 20% das proteínas animais comercializadas pelo Brasil no exterior nos três primeiros meses deste ano.
Também se tornaram importantes para os setores de algodão e de celulose, adquirindo 24% e 39%, respectivamente, do que o país exporta.
Um dos eventos mais rumorosos foi a especulação sobre a mudança da embaixada em Israel.
Naturalmente, a medida não é bem-vista pelos árabes, parceiros importantes do agronegócio brasileiro. Por ora, a promessa é apenas abrir um escritório de representação comercial.
De janeiro a março, o Oriente Médio deixou US$ 1,7 bilhão no país com compras no setor de agronegócio. Levou 26% das carnes brasileiras, 16% dos cereais e 15% do açúcar.
À distância, a ministra da Agricultura, Teresa Cristina, não se meteu em confusão e teve apenas de administrar as trapalhadas do governo (Folha de S.Paulo, 9/4/19)