19/02/2019

Privatização da Eletrobras vai ficar para 2020, diz ministério

Privatização da Eletrobras vai ficar para 2020, diz ministério

Minas e Energia quer reavaliar modelo de capitalização; Tesouro revê Orçamento.

A venda das ações da Eletrobras no mercado financeiro, processo que levará a União a deixar o controle da companhia, não deve ocorrer neste ano, como previa o governo federal.

A mudança de rota levou o Tesouro Nacional a rever a sua previsão orçamentária.

A secretária-executiva do MME (Ministério de Minas e Energia), Marisete Pereira, afirmou à Folha que o governo está reavaliando o modelo de capitalização da Eletrobras. Com isso, não deve dar tempo de realizar a operação financeira ainda neste ano.

"Essa é uma pauta prioritária do ministério. É certo que faremos a capitalização", disse Pereira. "O ministro já afirmou que o processo está mantido. O que estamos discutindo é o modelo, como fazer. Pelo que vejo, deve ficar para 2020."

Diante da incerteza, a equipe econômica decidiu retirar a receita de R$ 12 bilhões que estava prevista no Orçamento da União de 2019.

A retirada dos recursos da conta tem previsão de ser oficializada no fim de março, quando o governo concluirá a primeira revisão bimestral de receitas e despesas.

Em 2018, o governo também chegou a prever a entrada dos R$ 12 bilhões em caixa. Porém, com a resistência política à privatização, a equipe econômica decidiu congelar despesas que seriam pagas com esses recursos até que tivesse certeza da operação.

Desta vez não é diferente. O TCU (Tribunal de Contas da União) tem insistido para que o Tesouro Nacional seja mais conservador em suas estimativas de receita.

"Não dava para manter [no Orçamento] porque o projeto foi arquivado pelo Congresso. Não é mais uma receita prevista. Temos agora de enviar um novo projeto", disse Pereira.

Segundo a secretária-executiva, a principal alteração é que não será preciso prever tantos detalhes como o texto que foi enviado pelo ex-presidente Michel Temer (MDB).

"A gente só precisa de um marco legal permitindo que as usinas que hoje operam no regime de cotas possam gerar energia pelo sistema de produção independente [livre mercado]. O restante a gente pode resolver no ministério."

No entanto, ainda segundo Pereira, o projeto deve prever a golden share —ação que dá à União poderes especiais de veto em assuntos considerados estratégicos. Também incluirá o limite de 10% de ações para voto em assembleias.

A venda das ações em Bolsa é crucial para a Eletrobras porque, com o dinheiro que captar no mercado, pagará à União pelo direito de operar 14 usinas hidrelétricas com regras e preços de mercado.

É essa receita —a chamada outorga— que o governo contabilizará no Orçamento assim que a remodelagem da operação ficar acertada e o novo projeto de lei autorizando a operação financeira for enviado ao Congresso.

No governo Temer, a ideia era destinar mais de 50% das ações em poder da União para serem vendidas ao mercado.

Uma trava de 10% foi definida para impedir que, mesmo adquirindo um grande volume de ações, um único comprador não possa assumir o controle da empresa. O objetivo é que a Eletrobras tenha capital pulverizado e seu comando seja definido por uma administração profissional.

Há outro fator que complica a discussão sobre a capitalização e pode afetar o valor que a União vai arrecadar com a operação. A Eletrobras precisa resolver como pagar uma conta antiga, referente ao chamado risco hidrológico, e isso pode afetar negativamente o preço das ações.

Sempre quando chove menos do que o previsto, o governo aciona as usinas térmicas. Isso gera um aumento na tarifa ao consumidor porque as usinas hidrelétricas não conseguem produzir o volume de energia contratado.

Em 2018, essa conta foi de cerca de R$ 20 bilhões.

Esse cálculo terá de ser levado em consideração porque as 14 usinas que operam no regime de cotas também foram afetadas.

O governo pretende resolver esse impasse em outro projeto de lei. Uma das propostas é alongar o prazo de concessão das usinas como forma de quitar essa conta.

A discussão é um pouco mais complexa porque, além de mexer no passado, o projeto vai também definir as regras de como funcionará o sistema de garantias dadas pelas usinas no processo de geração de energia.

"Hoje as garantias não refletem a geração efetiva das hidrelétricas", disse Pereira.

O desafio, segundo ela, será mudar essa regra sem que isso represente quebra de contrato. Pereira afirma que o principal objetivo do Ministério de Minas e Energia é dar segurança jurídica aos investidores privados e a questão fiscal não é a mais relevante.

Sem a receita da Eletrobras, porém, a equipe econômica terá mais dificuldade em reduzir o rombo nas contas públicas neste ano, previsto em R$ 139 bilhões.

Ao projetar o resultado negativo, ainda em 2018, o governo contava com os recursos da operação com a Eletrobras (Folha de S.Paulo, 18/2/19)