
Produtor 5.0 desponta no agro brasileiro - Por Maurício Antônio Lopes

Inspirado pelos avanços da agricultura digital e pelo uso de inteligência artificial, sensoriamento remoto, bioinsumos, energia limpa e modelos colaborativos, esse novo ator do agro brasileiro representa uma síntese entre tradição e modernidade.
Durante muito tempo, a imagem dominante do agricultor no Brasil esteve associada a estereótipos que pouco refletem a complexidade atual do setor. De um lado, o pequeno produtor familiar, visto como guardião de tradições; de outro, o grande empresário rural, muitas vezes retratado como resistente a mudanças. No entanto, uma nova geração de produtores começa a ganhar protagonismo, e com ela emerge um novo paradigma para a agricultura brasileira.
Ainda em formação, o perfil do produtor 5.0 caracteriza-se por uma postura empresarial e inovadora, apoiada em tecnologias digitais, inteligência de dados e integração com cadeias globais de valor. Trata-se de um tipo de liderança que vai além da adoção de ferramentas: esse produtor atua de forma estratégica, gerenciando sistemas produtivos complexos, conciliando rentabilidade com regeneração ambiental, inovação e engajamento com a sociedade.
Inspirado pelos avanços da agricultura digital e pelo uso de inteligência artificial, sensoriamento remoto, bioinsumos, energia limpa e modelos colaborativos, esse novo ator do agro brasileiro representa uma síntese entre tradição e modernidade. Ao mesmo tempo em que valoriza o conhecimento agronômico e empírico herdado de gerações, ele incorpora saberes contemporâneos de gestão, sustentabilidade e tecnologia.
Um dos sinais mais relevantes dessa mudança é o crescente interesse de jovens pelas atividades agropecuárias. O Brasil destaca-se como um dos poucos países em que o campo atrai novas gerações, sinalizando uma renovação demográfica promissora. O empreendedorismo rural, impulsionado pela ciência e tecnologia, ganha força, conectado com as agendas sociais e ambientais do século XXI.
Essa transição positiva se ancora em características estruturais do Brasil. A diversidade e a escala da produção agrícola, aliadas a ecossistemas de inovação em expansão, criam um ambiente promissor.
A presença de redes de pesquisa, cooperativas tecnificadas, agtechs e instituições de ensino técnico e superior, como institutos federais, Senar e universidades, fortalece a formação de capital humano de alta qualidade no campo.
A crescente atuação feminina é outro vetor transformador. Mulheres jovens, muitas com formação técnica ou superior, vêm assumindo a liderança de propriedades, inovando, organizando redes e atuando com protagonismo em múltiplas frentes. Essa presença amplia o horizonte da inovação e da governança rural.
É evidente que persistem grandes desafios: conectividade limitada, acesso desigual a crédito e assistência técnica, além de lacunas em políticas públicas inclusivas. Mas reconhecer a emergência de uma nova dinâmica no agro brasileiro é essencial. O produtor 5.0 está longe de ser maioria, mas sua presença crescente sinaliza uma inflexão histórica.
Num mundo que busca alimentar bilhões sem comprometer os ecossistemas, o Brasil pode se destacar como referência em soluções sustentáveis. Apoiar essa transição com políticas, ciência, conectividade e valorização social deve ser prioridade. O produtor 5.0 não é promessa distante. Ele desponta com vigor — e pode ser um dos ativos mais estratégicos do país no século XXI (Maurício Antônio Lopes é engenheiro agrônomo e pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); Globo Rural, 2/7/25)