15/10/2018

Produtores de cana denunciam favorecimento de indenizações para Usinas

Produtores de cana denunciam favorecimento de indenizações para Usinas

Valor deve ser rateado em algumas situações, entre produtores cooperados. Por NOVA CANA.

O governo federal está pagando bilhões de reais para as usinas de açúcar e etanol em função de uma política questionável do passado. Porém, os produtores de cana podem ficar sem uma fatia desse dinheiro.

A política de controle de preços de açúcar e etanol realizada pelo governo brasileiro entre 1985 e 1991 causou perdas financeiras consideráveis para as usinas. Assim, muitas companhias optaram por questionar na justiça o tabelamento do extinto Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) – com decisões favoráveis ao longo dos últimos oito anos.

Um marco nesse sentido aconteceu em abril, quando o Superior Tribunal Federal (STF) estabeleceu uma indenização de R$ 5,6 bilhões para a Copersucar. O valor, que será recebido de forma parcelada, deve ser rateado entre as usinas que eram cooperadas em 1990.

Com isso, há a expectativa de novos pareceres favoráveis. Conforme o Valor Econômico, segue em trâmite outro pleito da companhia, de R$ 12,8 bilhões. Além disso, o jornal publicou uma estimativa do advogado Gabriel Buscarini Leutewiler, do escritório Santos Neto, afirmando que outras ações movidas por empresas associadas à Copersucar podem alcançar cerca de R$ 30 bilhões.

A questão, agora, é se os fornecedores de cana-de-açúcar dessas unidades também possuem direito a receber parte desses valores. A justificativa, conforme explicitado em uma coluna de Cláudio Humberto publicada no Jornal Metro, é que, com o controle do IAA sobre os preços do produto final, o valor de venda da matéria-prima também foi afetado.

O argumento se respalda no artigo 11 da Lei 4.870, de 1965, que regulamenta aspectos relacionados ao IAA e estabelece que: “ao valor básico do pagamento da cana (...), será acrescida a parcela correspondente a percentagem da participação do fornecedor no rendimento industrial situado acima do rendimento médio do Estado, considerado, para esse fim, o teor de sacarose e pureza da cana que fornecer”.

O mesmo artigo ainda aponta que a cana-de-açúcar com índices inferiores aos fixados terão descontos proporcionais. Além disso, caso a usina não estivesse habilitada para calcular o teor de sacarose e a pureza da cana, ela não poderia realizar deduções.

O novaCana entrou em contato para a Copersucar para questionar se os canavieiros possuem direito a esses repasses e se há realmente um atrito entre produtores e usinas que participaram do rateio. Por meio de sua assessoria de imprensa, no entanto, a cooperativa se limitou a afirmar que “não presta declarações sobre matérias objeto de discussões ou decisões judiciais”. O advogado da cooperativa, Hamilton Dias de Souza, da Dias de Souza Advogados Associados, também não quis dar entrevista.

A reportagem ainda entrou em contato com a Cooperativa dos Plantadores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo (Copercana), que optou por não comentar o tema, e com a Organização de Plantadores de Cana da Região Centro-Sul do Brasil (Orplana), que afirmou ainda não ter um posicionamento sobre o caso. “Infelizmente, não poderemos nos pronunciar”, afirma.

Precatórios comprometidos

Além disso, mesmo antes de receber esses valores, algumas companhias já possuíam destino certo para as indenizações – a princípio, sem menção aos fornecedores.

De acordo com o Valor Econômico, em 2017, a Cosan vendeu seus direitos creditórios referentes a precatórios do IAA para a Jus Capital e a Farallon Latin America Investimentos, antes mesmo da decisão final da justiça. Segundo a reportagem, o crédito de R$ 3,5 bilhões foi negociado por R$ 1,3 bilhão, acrescido de um percentual fixo atrelado ao prazo do recebimento.

Ainda conforme o Valor, o Grupo Virgolino de Oliveira (GVO) pretende utilizar os valores como remuneração adicional em uma emissão de US$ 200 milhões em bonds. Ademais, outras companhias estariam usando os precatórios como garantia em negociações de empréstimos.

Entenda o caso

A origem das ações judiciais movidas pela Copersucar e outras companhias do setor envolvem o preço fixado pela União para açúcar e etanol, realizado por meio do IAA entre 1985 e 1991. A alegação é que os valores estabelecidos não eram suficientes para cobrir os custos de produção.

Para embasar esse argumento, as usinas recorreram a estudos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que apontam que o tabelamento gerou prejuízos às empresas. O cálculo das indenizações gerou controvérsias ao longo dos anos e motivou recursos judiciais por parte da União.

Criado pelo presidente Getúlio Vargas em 1933, o IAA definiu diretrizes para o setor até sua extinção, no governo de Fernando Collor de Mello. Segundo o Valor Econômico, a instituição enfrentava acusações de incompetência e corrupção, além de receber críticas do setor privado (Correio do Estado, 12/10/18)