20/06/2025

Produtores de MT relatam aumento de custos e margens apertadas

Produtores de MT relatam aumento de custos e margens apertadas

Custos de produção para a próxima temporada estarão ainda mais altos, principalmente com a escalada dos preços dos fertilizantes — Foto Ruy Baron

 

Há preocupação com o patamar de juros do Plano Safra 25/26 e impacto da reforma tributária.

 

Apesar da “safra cheia” de grãos neste ano, produtores rurais de Mato Grosso alertam que as margens estão mais comprimidas no campo. Eles afirmam que os custos de produção para a próxima temporada estarão ainda mais altos, principalmente com a escalada dos preços dos fertilizantes, a partir das guerras no Oriente Médio, o que pode enxugar ainda mais a renda do setor. Há preocupação também com o patamar de juros do Plano Safra 25/26 e dúvidas sobre o impacto da reforma tributária no setor.

 

“O produtor de Mato Grosso está endividado, está com renda comprometida. Se não fosse a indústria etanol de milho, a situação que não é boa, poderia estar pior”, disse Wellington Andrade, diretor-executivo da Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado (Aprosoja-MT) durante evento em Sorriso (MT).

 

Ilson Redivo, presidente do Sindicato Rural de Sinop, no norte do Estado, e vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato), disse que a “crise econômica” no país, com juros altos e preços mais baixos das commodities, que mina a rentabilidade dos produtores.

 

“Estamos atravessando um momento de crise nunca vista. Prova disso é o movimento das recuperações judiciais, que é algo fora da curva, e o crédito rural que está ficando difícil para o produtor”, afirmou ao Valor durante evento da Associação Brasileira dos Produtores de Milho e Sorgo (Abramilho), em Sorriso (MT). “Os bancos estão cobrando mais e sendo mais seletivos. E o produtor não está tendo renda”, completou.

 

Redivo disse que os preços de comercialização de milho e soja, próximos de R$ 40 e R$ 100 por saca, estão abaixo do necessário para cobrir os custos e que a tributação aplicada sobre essa produção retira a rentabilidade dos agricultores mato-grossenses. Ele citou, por exemplo, a contribuição para o Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab), que consome 3% da receita bruta anualmente.

 

“Somos geradores de renda, mas não está sobrando renda para o produtor. A margem está distribuída entre os demais setores. Estamos colhendo bem, mas não sobra nada para o bolso do produtor”, reclamou.

 

O deputado estadual Xuxu Dal Molin (União Brasil) cobrou a revisão do percentual da contribuição. “Temos que discutir como baixar o Fethab nos próximos governos. A carga tributária está matando o produtor. O governo tem que pensar, com gestão eficiente, em como baixar o Fethab, desonerar e dar mais viabilidade, renda para homem do campo”, disse em painel no evento.

 

Diogo Damiani, presidente do Sindicato Rural de Sorriso, destacou a preocupação com os custos de produção para a próxima safra. “Isso pode impactar no bolso do produtor. Nos anos pós-pandemia, a nossa margem foi reduzida por aumento dos custos e redução dos preços das commodities”, indicou.

 

A guerra entre Irã e Israel e o impacto nos preços do petróleo e dos fertilizantes nitrogenados também são pontos de atenção, disse Damiani. A falta de infraestrutura de armazenagem, cenário que se repete em boa parte do país, é outro gargalo.

 

“No próximo ano, temos vários desafios. A implementação da reforma tributária, que ainda não sabemos como vai impactar o produtor. Temos o lançamento do Plano Safra, que provavelmente vai vir com alta na taxa de juros.

 

O presidente da Aprosoja-MT disse que apenas o cultivo de soja, atualmente, para quem é arrendatário não é capaz de pagar os custos. “Quem tem arrendamento, tem custo de cerca de R$ 7 mil por hectare e a renda, para quem colhe bem, é de R$ 6,4 mil atualmente. São R$ 600 de prejuízo por hectare. É a cultura sucessória, do milho, que viabiliza a produção no Estado”, afirmou.

 

O governador em exercício de Mato Grosso, Otaviano Pivetta (Republicanos) minimizou a queda nos preços das commodities e disse que o movimento é cíclico na agricultura. Para a redução de custos no campo, ele disse que o governo quer entregar mais obras para melhoria da infraestrutura logística no Estado.

 

“O governo tem se esforçado para dotar a região de infraestrutura mais competitiva para estimular aumento da produção. A safra está se mostrando acima da média, isso demonstra a capacidade do Estado de produzir cada ano mais, o clima ajudou muito. Cabe ao governo investir cada vez mais na infraestrutura para o agricultor produzir mais”, disse à imprensa na chegada ao evento.

 

A principal obra atualmente é a duplicação da BR 163. Segundo ele, serão 850 quilômetros de rodovia duplicada até o fim do próximo ano. “Se faltar [algum trecho duplicado], será pouco”, disse. Ele afirmou ainda que existem 26 mil quilômetros de rodovias estaduais sem pavimentação.

 

Ilson Redivo, vice-presidente da Famato, cobrou austeridade fiscal do governo federal para mudar os sinais enviados ao mercado e reverter o cenário de crise. “O ponto de ajuste é o equilíbrio fiscal das contas do governo. Passamos recentemente por pandemia, pelo início da guerra da Ucrânia e o Brasil cresceu. O governo tem que fazer o dever de casa e gastar só aquilo que ganha. Isso [desequilíbrio] desestabiliza a economia. Quando afeta um setor tão importante, podemos ter mais problemas pela frente”, concluiu.

 

Plano Safra

 

Os produtores rurais de Mato Grosso projetam que haverá aumento de até 1,5 ponto percentual nos juros do próximo Plano Safra (2025/26). Eles reclamam de dificuldades para acessar linhas de créditos nos bancos e dizem que os valores anunciados pelo governo não têm chegado na ponta.

 

“É preciso ter linhas de crédito. O próximo Plano Safra tem projeção de aumento de 1,5%. Mas não adianta fazer propaganda imensa do maior Plano Safra da história se o dinheiro não chegar ao produtor rural”, afirmou Diogo Damiani, presidente do Sindicato Rural de Sorriso (MT).

 

Os agricultores de Sorriso cultivam 540 mil hectares de soja e 440 mil hectares de milho. A produção estimada é de 2,1 milhões de toneladas da oleaginosa e 3,3 milhões de toneladas do cereal nesta temporada. O Plano Safra 2025/26 deve ser anunciado até o fim de junho.

 

Damiani citou pesquisas que revelam que muitos produtores, mesmo aptos, não conseguem acessar recursos de linhas de crédito rural nas instituições financeiras atualmente. “Cerca de 85% dos produtores estão aptos a captar, como o dinheiro não chega na ponta?”, questionou.

 

Em Mato Grosso, porém, o crédito do Plano Safra representa menos de 9% do funding de financiamento do custeio de soja, segundo dados apresentados pela Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA) e pelo Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea), no fim de 2024. A estimativa era de acesso a R$ 4,37 bilhões em linhas com recursos federais na temporada 2024/25. O financiamento via empresas multinacionais, revendas, com recursos próprios dos produtores e via linhas irrigadas com dinheiro próprio dos bancos aparecem na frente.

 

Mauro Osaki, pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Agropecuária (Cepea/Esalq-USP), disse que as iniciativas do governo federal para reajustar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e para taxar os rendimentos de títulos como as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) e Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), atrapalham a formação de funding para financiamento do setor na próxima safra.

 

“O dinheiro está mais caro em momento de custo mais elevado, isso é mais desafiador. O setor passa por uma situação de repensar suas estratégias e tentar mitigar os riscos com os quais estamos trabalhando”, afirmou no evento (Globo Rural, 18/6/25