02/06/2025

Produtores do RS rejeitam proposta do governo; protestos se espalham

Produtores do RS rejeitam proposta do governo; protestos se espalham

Quatro secas, uma enchente histórica e R$ 150 bilhões em prejuízos nos últimos anos. Esse é o passivo enfrentado por produtores rurais do Rio Grande do Sul. Resultado: débitos rurais impagáveis.

 

Resolução do Conselho Monetário Nacional não agradou o setor. Agricultores pedem solução a longo prazo.

 

Na tentativa de resolver o problema, a Resolução 5.220 do Conselho Monetário Nacional (CMN), publicada nessa quinta-feira (29), prorroga por três anos as dívidas de custeio. Para as parcelas de investimento com vencimento neste ano, o prazo será estendido por um ano.

 

Os produtores com dívidas contraídas no Pronaf e no Pronamp poderão renegociar os débitos de até R$ 90 mil. Além disso, a instituição financeira só pode renegociar até 8% do saldo das parcelas de custeio com vencimento em 2025, contratadas com recursos equalizados pelo tesouro nacional.

 

Solução não agradou produtores

 

A proposta do governo federal não agradou os agricultores do estado. Prova disso é a continuidade dos protestos que bloqueiam rodovias importantes e que se seguiram nesta sexta-feira, um dia após a publicação do CMN. A estimativa é que as mobilizações estão espalhadas em mais de 60 municípios gaúchos.

 

Os agricultores que fazem parte do movimento pedem uma solução a longo prazo, como a securitização de R$ 60 bilhões para pagamento em 20 anos. O projeto do senador Luís Carlos Heinze já foi aprovado pela Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado e aguarda apreciação da Comissão de Assuntos Econômicos.

 

“Prometeram quatro anos [de prorrogação de dívidas], ofereceram três anos, tem problemas com o Pronamp, com o Pronaf, com o limite de 8% para os demais. Será um problema para o Sicredi, por exemplo, que não vai ter condição de contemplar todos os agricultores. Os outros bancos da mesma forma. Não saiu na resolução a questão específica dos bancos de fábrica, que muita gente tem problema. Então tem muito a consertar”, diz o senador Luiz Carlos Heinze.

 

Segundo ele, o grupo técnico da bancada do Congresso que analisa o tema, composto por bancos e entidades, como Fetag e Farsul, está trabalhando para corrigir as distorções que apontam na resolução.

 

Esta semana também foi entregue ao ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, uma proposta do deputado Alceu Moreira que não depende de orçamento do governo federal, mas sim dos fundos.

 

“Os modelos anteriores de pegar dinheiro do Orçamento [não servem mais], nós não temos folga orçamentária. A securitização precisa, na verdade, transformar a dívida do produtor, dívida líquida, contraída e certa com o credor e tamanho da dívida correta.

Quando este modelo estiver pronto, se pega e se compra essa dívida com o Fundo e coloca esse título, uma CPR, um papel que representa esse compromisso para o produtor pagar em 15, 20 anos. Ao comprar essa dívida, se reabilita o produtor, ele fica sem débito nenhum e vai ter o compromisso de pagar a safra seguinte e 1/15 da safra que passou. […] o que estou dizendo não precisa de um centavo do Orçamento, os Fundos financiam por si só”, diz Moreira (Canal Rural, 30/5/25)

 

Produtores gaúchos protestam e bloqueiam estradas por soluções para o endividamento

Protesto de produtores rurais em Bagé (RS) agricultores pedem securitização das dívidas — Foto SOS Agro RS Divulgação

 

Agricultores exigem a securitização das dívidas, que somam cerca de R$ 72 bilhões.

 

Apesar da publicação, nesta quinta-feira (29/5), da resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) que autoriza as instituições financeiras a prorrogarem os vencimentos das parcelas de crédito rural dos agricultores afetados por eventos climáticos, a medida não satisfez os agricultores gaúchos, que exigem a securitização das dívidas, que somam cerca de R$ 72 bilhões.

 

Nesta sexta-feira (30/5), os agricultores do Rio Grande do Sul realizaram diversos protestos e bloqueios de estradas que já estavam programados antes da publicação da medida. "Mais de 150 municípios estão mobilizados. Como a resolução que permite a prorrogação é insuficiente e não atende todo mundo, o pessoal vai continuar nas estradas até que o governo trate da securitização. Não tem como o produtor continuar na lavoura se ele não tiver um prazo maior para pagar todo esse endividamento", afirmou Grazielle de Camargo, coordenadora do movimento SOS Agro RS.

 

Em alguns pontos, a interrupção do fluxo de veículos ocorre no modelo “pare e siga”. Em outros, o tráfego está sendo liberado de hora em hora, ou intervalos de 10 ou 5 minutos.

 

Até às 14h15, a Polícia Rodoviária Federal contabilizava 25 bloqueios em rodovias gaúchas devido às manifestações dos produtores rurais. Os protestos ocorriam nas BRs 116 (Barra do Ribeiro, Tapes e Arroio Grande), 153 (Bagé), 158 (Cruz Alta, Julio de Castilhos, Santa Maria e Santana do Livramento), 285 (Entre-Ijuís, Vacaria, São Borja e São Luiz Gonzaga), 287 (São Pedro do Sul e Jaguari), 290 (Vila Nova do Sul, Pantano Grande, São Gabriel, Santa Margarida do Sul, Rosário do Sul e Alegrete), 386 (Frederico Westphalen) e 392 (Canguçu, São Sepé e Guarani das Missões).

 

Protesto de produtores rurais em Rosário do Sul (RS) — Foto: SOS Agro RS/Divulgação

 

A principal reclamação dos produtores gaúchos é sobre as dívidas já vencidas. A expectativa era que a resolução do CMN trouxesse medidas para as parcelas que já venceram até maio. Nessa semana, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, chegou a mencionar em audiência pública no Congresso Nacional que a prorrogação seria retroativa, ou seja, contemplaria essas prestações, o que não ocorreu.

 

Uma fonte do governo informou que a prorrogação das parcelas já vencidas depende de uma negociação entre o produtor e instituição financeira. No caso do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), podem ser adiadas prestações com até 30 dias de atraso, mas o agricultor está sujeito aos encargos de inadimplência.

 

Um dos principais bancos com atuação no Rio Grande do Sul apontou que a maior parte das parcelas de custeio vence em junho e julho. Dessa forma, o ‘grosso’ das dívidas estaria abrangido pela medida aprovada ontem.

Protesto de produtores rurais em Candelária (RS) — Foto: SOS Agro RS/Divulgação

 

O senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) afirmou que a medida deixa de fora muitos produtores gaúchos que sofreram perdas na produção em razão da sequência de secas e enchentes. “A regra do custeio vale apenas para quem faz parte dos programas Pronaf e Pronamp. Quem está nessas modalidades poderá adiar 100% das parcelas por até 36 meses. Os outros produtores, mesmo os que tiveram grandes perdas, só poderão renegociar os contratos com recursos equalizados até o limite de 8% da carteira do banco. Isso é pouco diante da tragédia no nosso estado”, criticou Heinze.

 

Segundo Heinze, os produtores esperavam mais e que há uma corrida para que não se perca o prazo da prorrogação. “Apesar de admitir o enquadramento das parcelas inadimplentes, a resolução determina que o pedido de prorrogação deve ser feito antes do vencimento da operação.

 

Muitos produtores têm dívidas em atraso desde 15 de abril. Essa confusão pode atrapalhar ainda mais e impedir o acesso ao benefício. É preciso evitar entendimento diverso nas agências”, alertou.

 

Já o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou que é impossível promover uma renegociação ampla das dívidas rurais com recursos do Tesouro Nacional para a equalização de juros.

 

"Não se torna viável nesse momento fazer qualquer ação de repactuação que careça de recursos oriundos do orçamento geral da União. É impossível. Tem alternativas, como os fundos que são independentes ao Tesouro", explicou Fávaro.

 

O ministro defendeu a criação de um fundo garantidor com participação do governo do Rio Grande do Sul para assegurar o apoio aos produtores. “Há

sensibilidade do governo para atender produtores gaúchos”, disse o ministro.

 

CMN são relevantes, especialmente a possibilidade de prorrogar em até três anos o custeio do Pronaf e do Pronam, mas ainda não atendem totalmente a necessidade dos agricultores e pecuaristas familiares.

 

“Essas resoluções ajudam, mas não resolvem o problema. O que conseguimos agora foi importante porque desafoga os produtores. Mas vamos continuar firmes, mobilizados, negociando soluções estruturais”, reforça Joel (Globo Rural, 30/5/25)