27/02/2025

Psol propõe taxar exportações de alimentos

Psol propõe taxar exportações de alimentos

Base aliada do governo no Congresso Nacional acena com projetos para tributar exportações de produtos agropecuários. Foto Agência Brasil

 

Texto proíbe a adoção de imposto zero nas vendas externas de alimentos in natura e semielaborados.

Em meio a negativas iniciais do governo federal para ideias de limitar exportações de produtos agropecuários, a base aliada de Lula no Congresso Nacional apresentou uma proposta para estabelecer um piso mínimo de 5% para a tributação da venda externa de alimentos in natura e semielaborados.

O projeto de lei complementar 48/2025 visa a impedir a possibilidade de imposto zero sobre as exportações e prevê um reajuste mensal das alíquotas, de acordo com a inflação dessa cesta de produtos apurada internamente. É assinado pelos deputados federais Fernanda Melchionna (Psol-RS), Sâmia Bomfim (Psol-SP) e Glauber Braga (Psol-RJ).

Em 2021, o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), com amplo apoio da bancada petista, apresentou proposta semelhante, que aguarda votação na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara Federal após ser rejeitada na Comissão de Desenvolvimento Econômico em 2023.

Atualmente, a lei brasileira diz que o imposto de exportação pode chegar a 30%, mas delega ao Poder Executivo a possibilidade de zerar a taxação, o que ocorre para os produtos agropecuários. Armas e cigarros são alguns itens cuja venda externa é tarifada.
De acordo com os autores, os objetivos são garantir que “uma parcela da produção seja mantida no mercado interno” e evitar “desabastecimento e choques inflacionários descontrolados”. A maior parte da produção agropecuária brasileira é consumida internamente. No caso da carne bovina, por exemplo, apenas 32% do volume produzido foi exportado em 2024.

A proposta, apresentada no início desta semana, estabelece um mecanismo dinâmico para o imposto de exportação sobre produtos agropecuários. A ideia é tornar a taxação um “estabilizador automático” dos preços dos alimentos. Segundo o texto, a tributação deve fazer com que as cotações desses itens essenciais acompanhem a inflação geral do país, com intervalo de tolerância de 2,5% acima ou abaixo do índice.

A ideia é que haja um monitoramento mensal para dosar e ajustar as alíquotas de exportação, com base na variação dos preços internos dos alimentos no IPCA, “para garantir a convergência dos preços ao intervalo esperado”, segundo a proposta. Nos casos em que o imposto não for suficiente para estabilizar os preços, o Ministério da Fazenda deverá apresentar relatório técnico, com as justificativas e o detalhamento dos fatores que impediram o cumprimento da meta.

“Esse mecanismo assegura que o Brasil não fique à mercê das oscilações internacionais de commodities, evitando que eventos externos, como conflitos geopolíticos ou crises climáticas em outros países, comprometam o direito da população brasileira à alimentação adequada”, dizem os autores na justificativa do projeto.

Reportagem do Valor Econômico mostrou nesta quarta-feira (26/2) que a taxação de exportações chegou a ser discutida por um grupo técnico dos ministérios em Brasília, mas não avançou após críticas do setor produtivo e da ameaça do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, de deixar o cargo caso propostas dessa natureza avancem no Executivo.

Os parlamentares dizem, na proposta, que as medidas combatem a especulação e a volatilidade dos preços dos alimentos e reafirmam o papel do Estado na “regulação dos mercados, na garantia da soberania alimentar e na proteção das camadas mais vulneráveis da população”. Eles afirmam ainda que, ao priorizar o abastecimento interno e fortalecer a agricultura familiar, “a proposta corrige distorções do atual modelo agroexportador e coloca a segurança alimentar e o interesse público acima da lógica especulativa do mercado global”.

Outros países

Os parlamentares do Psol argumentam que taxas de exportação têm sido aplicadas em outros países e gerado estabilidade em momentos de flutuação de preços e risco de desabastecimento. Os deputados dizem também que o mecanismo pode ajudar a promover a indústria nacional, com incentivos para processamento de produtos primários e semielaborados no Brasil.

Um dos produtos citados no projeto é o café. “Atualmente, o Brasil exporta grãos de café cru, que são transformados em cápsulas de alto valor agregado em países como a Alemanha. Com o imposto de exportação, o país pode desincentivar a exportação de matérias-primas sem processamento e, ao mesmo tempo, estimular a criação de indústrias locais que transformem esses produtos em itens de maior valor, como cápsulas de café”, diz a justificativa do projeto.

Os alimentos in natura considerados pelo projeto são tubérculos, raízes e legumeshortaliças e verduras, frutas e ovos de galinha. Já os produtos semielaborados são cereais, leguminosas e oleaginosas, carne, pescados, frango e leite longa vida. Serão isentos do imposto, pela proposta, os itens cuja destinação ao mercado doméstico seja superior a 95% da produção total.

A proposta mira produtos agropecuários e minerais, cuja exportação totalizou R$ 1,18 trilhão em 2024. Na estimativa dos autores do projeto, a aplicação do imposto resultaria em arrecadação anual de R$ 59 bilhões.

O texto também indica a destinação dos recursos eventualmente arrecadados: viabilizar uma compensação orçamentária para aumentar o valor do Bolsa Família para R$ 800, cujo custo adicional é estimado em R$ 56,1 bilhões. O projeto ainda quer o aporte de R$ 2,9 bilhões no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e na formação de estoques públicos de alimentos, com a compra de produtos da agricultura familiar e o envio direto para cozinhas solidárias, restaurantes populares e equipamentos da rede socioassistencial.

A proposta prevê ainda a criação um benefício emergencial para agricultores familiares afetados por eventos climáticos extremos. Os beneficiários seriam produtores com renda bruta anual de até R$ 200 mil. Entre as medidas previstas estão suspensão de dívidas bancárias por três meses, assistência técnica especializada para recuperação produtiva e pagamento de auxílio financeiro de dois salários mínimos por família (Globo Rural, 26/2/25)