08/12/2023

Quais os limites e o potencial da captura de carbono?

Quais os limites e o potencial da captura de carbono?

Domos são vistos perto da planta da startup Carbfix em Olfus, Islândia- foto Marko Djurica Reuters

Domos são vistos perto da planta da startup Carbfix em Olfus, Islândia; a empresa é a primeira operadora de armazenamento mineral de dióxido de carbono do mundo, capturando permanentemente o CO2 ao misturá-lo com água e injetá-lo em rochas de basalto no subsolo - 

 

Tecnologia tem limitações reais de custo e desenvolvimento, mas especialistas afirmam que ela pode desempenhar um papel valioso.

Nas conferências anuais sobre o clima das Nações Unidas, líderes mundiais têm debatido há anos se devem "eliminar gradualmente" (do termo original em inglês "phase out") os combustíveis fósseis, como o carvão, ou apenas "reduzir" ("phase down") o seu uso.

Agora, outro termo ganhou destaque na cúpula deste ano, em Dubai: os países devem concordar em acabar com o uso de combustíveis fósseis "não compensados" (em inglês "unabated", ou seja, com emissões reduzidas)?

Essa escolha peculiar de palavras pode permitir que as nações continuem queimando carvão, gás e petróleo, desde que capturem e armazenem o dióxido de carbono resultante, impedindo que ele aqueça o planeta.

Uma grande controvérsia é sobre qual papel essa tecnologia, conhecida como captura e armazenamento de carbono, deve desempenhar na luta contra o aquecimento global. Alguns produtores de petróleo e gás afirmam que ela deve ser central no planejamento para o futuro. Outros, incluindo muitos ativistas e líderes mundiais, descartam a captura de carbono como algo não comprovado e arriscado demais.

Alguns estudos recentes descobriram que a captura de carbono pode ser uma ferramenta valiosa para reduzir as emissões de certas atividades, como a fabricação de cimento.

Mas seu uso provavelmente será limitado: seria quase impossível para os países continuar queimando combustíveis fósseis nas taxas atuais e capturar ou compensar todo o CO2 que é liberado na atmosfera. A tecnologia é cara e, em muitos casos, existem alternativas melhores.

 

Apesar de bilhões de dólares em investimentos, países e indústrias também têm enfrentado dificuldades para colocar em funcionamento projetos de captura de carbono até agora. A menos que isso mude rapidamente, afirmam os especialistas, essa tecnologia pode desempenhar apenas um papel marginal nos esforços climáticos.

"A captura e armazenamento de carbono definitivamente poderia ser uma tecnologia crucial", disse Fatih Birol, diretor executivo da AIE (Agência Internacional de Energia). "Mas a história da captura de carbono até o momento tem sido em grande parte uma decepção."

O (LIMITADO) PAPEL DA CAPTURA DE CARBONO

Em setembro, a Agência Internacional de Energia publicou um roteiro detalhado sobre o que seria necessário para reduzir as emissões energéticas do mundo para quase zero até meados do século, a fim de diminuir o risco de perturbações climáticas catastróficas.

Nesse roteiro, a captura de carbono representava apenas 8% das reduções totais de emissões globais entre hoje e 2050. Em contraste, a maioria das reduções viria do abandono completo dos combustíveis fósseis pelos países: aumentando a dependência de energia eólica e solar para eletricidade e substituindo carros movidos a gasolina por carros elétricos.

O custo é uma das razões. Em teoria, as empresas poderiam instalar um dispositivo de captura de carbono em quase qualquer fábrica ou usina de energia que queime combustíveis fósseis hoje. Mas, na prática, muitas vezes é mais barato fechar uma usina de carvão e substituí-la por uma combinação de energia eólica, solar e baterias, ou trocar uma caldeira a gás por uma bomba de calor elétrica.

Ainda assim, existem casos em que a captura de carbono pode ser a melhor opção. Um deles pode ser os fornos de cimento, que liberam imensas quantidades de dióxido de carbono ao transformar calcário em cimento. Alguns produtores de aço estão explorando a captura de carbono como uma forma de reduzir suas emissões. Companhias de eletricidade podem usar usinas a gás com captura de carbono como "backup" para a intermitência das energias eólica e solar.

 

Muitos pesquisadores diferem em suas estimativas de quanta captura de carbono provavelmente será necessária, mas, em geral, todos concordam com uma coisa: o uso total de combustíveis fósseis terá que diminuir drasticamente, independentemente do que for feito, para manter o aquecimento global em níveis relativamente baixos.

De acordo com o roteiro da Agência Internacional de Energia, por exemplo, petróleo, gás e carvão forneceriam apenas 10% da energia mundial em 2050, em comparação com cerca de 80% atualmente. Aproximadamente metade dessas emissões restantes de combustíveis fósseis seriam "mitigadas" com tecnologia de captura de carbono. A outra metade seria compensada principalmente com tecnologias de remoção de carbono, como a captura direta do ar, que é ainda menos desenvolvida.

Mais recentemente, a agência emitiu um relatório alertando os produtores de combustíveis fósseis contra "expectativas excessivas e dependência" da captura de carbono para manter sua participação de mercado atual, observando que custaria US$ 3,5 trilhões (R$ 17,12 trilhões) por ano para capturar ou compensar todas as emissões da produção atual de petróleo e gás. A captura de carbono, concluiu a agência, "não é uma forma de manter o status quo".

A CAPTURA DE CARBONO TEM DEMORADO A CRESCER

Mesmo que a captura de carbono acabe desempenhando apenas um papel de apoio na luta contra as mudanças climáticas, a tecnologia ainda precisaria se expandir rapidamente para fazê-lo.

Atualmente, ela não está no caminho certo.

Em todo o mundo, indústrias capturam cerca de 45 milhões de toneladas por ano, principalmente de pequenas plantas de processamento de gás natural. Nos últimos anos, impulsionadas por novos incentivos nos Estados Unidos e na Europa, as empresas propuseram uma série adicional de grandes novos projetos que, se construídos, aumentariam a capacidade de captura para mais de 400 milhões de toneladas por ano até 2030.

Mas isso ainda está muito aquém das 1 bilhão de toneladas por ano que os países precisariam capturar e armazenar até o final da década, de acordo com o roteiro de emissões zero da AIE.

E nem todos os projetos anunciados necessariamente serão construídos. Apenas uma pequena fração —correspondente a 6% da capacidade total— está na fase da decisão final de investimento. O planejamento dos projetos é complicado, exigindo coordenação entre diferentes empresas que capturam, transportam e, por fim, enterram o CO2.

 

"A complexidade operacional desses projetos pode ser um grande obstáculo", disse Paola Perez Peña, analista de pesquisa da S&P Global Commodity Insights. "Muitos projetos anunciaram a intenção de capturar dióxido de carbono, mas ainda é necessário desenvolver um local de armazenamento. E isso pode criar uma dinâmica de ovo ou galinha: quem vai investir primeiro?"

Nos Estados Unidos, os legisladores recentemente ampliaram os créditos fiscais para empresas que capturam dióxido de carbono das chaminés, e um número crescente de empresas de etanol, fertilizantes e hidrogênio está buscando usar a tecnologia. Mas, no Meio-Oeste americano, proprietários de terras e ambientalistas se opuseram a novos oleodutos para transportar o dióxido de carbono para locais de descarte. Empresas que desejam abrir novos poços de armazenamento subterrâneo criticaram a lentidão do processo de licenciamento federal.

Alguns especialistas dizem que a tecnologia pode ser útil na China, que produz cerca de metade do cimento e aço do mundo. Mas, além de alguns projetos-modelo, o país ainda não desenvolveu um plano para implantar a captura de carbono em grande escala.

"A China está enfrentando um excesso massivo com todas as usinas de carvão que construiu, e muitas delas ainda são novas, então, a menos que desative essas usinas, há um atrativo considerável em usar a captura de carbono", disse Roman Kramarchuk, chefe de perspectivas de energia futura da S&P Global Commodity Insights. "Mas ainda não vimos a China desenvolver uma política abrangente" (The New York Times, 7/12/23)