22/03/2018

Quebra de safra de soja na Argentina salva o Brasil

Produtores vizinhos deverão colher 28% menos neste ano

A agricultura é mesmo imprevisível e, muitas vezes, a rentabilidade ou a perda no campo é decidida no final do jogo. É o que ocorre neste ano. Os brasileiros estão sendo salvos pelos argentinos.

Era quase certo que a boa renda obtida nas safras recentes não se repetiria neste ano e que parte dos produtores nacionais teria dificuldades para fechar as contas em 2018.

Não é o que está ocorrendo. Uma forte seca castigou as principais áreas de produção da Argentina, e a safra de soja, que chegou a 58 milhões de toneladas em 2017 no país vizinho, deverá ficar em pouco mais de 40 milhões neste ano.

A reação do mercado às perspectivas de quebra da safra argentina foi imediata, elevando os preços internos.

O valor médio da soja neste mês no mercado disponível é de R$ 71,93 por saca, em Cascavel (PR). Esse preço supera em 6,3% o de fevereiro e em 7,5% o de janeiro.

Em Sorriso, importante região de produção de Mato Grosso, a soja acumula alta de 10,5%, em relação aos valores de janeiro, segundo pesquisa da AgRural.

"Em geral, altas de preços não são comuns no mercado brasileiro nos meses de março e de abril. Nesta época do ano, os preços internos sofrem a pressão da entrada da safra", diz Daniele Siqueira, analista da AgRural.

Nos últimos 18 anos, até 2017, o preço médio de abril e de maio caiu em 13 ocasiões em Cascavel, em relação aos de fevereiro. Em Sorriso, a queda foi de 11 vezes no mesmo período, afirma Siqueira.

"O ocorrido neste ano foi um golpe de sorte, já que a safra 2017/18 estava muito pouco comercializada até janeiro", diz ela.

"Em fevereiro, as vendas ganharam um bom impulso, por causa dos preços mais altos. Agora em março, porém, já perderam parte do fôlego, pois os produtores querem preços ainda mais elevados", acrescenta.

O DESAFIO PERSISTE

O produtor se livrou de uma queda de preços neste ano, mas precisa ficar atento ao próximo. Apesar da quebra de safra na Argentina, os estoques mundiais estão elevados.

No final de agosto, deverão estar em 94,4 milhões de toneladas, o segundo maior da história. No ano passado, atingiram 96,7 milhões, segundo o Usda (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos).

O desafio persiste. Os americanos deverão semear uma área de soja maior do que a de milho, em tempos normais, pela primeira vez.

Isso só correu em 1983/84, quando o excesso de chuva impediu o plantio de milho, que foi substituído, em parte, pelo de soja.

A área de soja também aumenta no Brasil e deverá atingir o recorde de 36 milhões de hectares em 2018/19, conforme as estimativas mais otimistas.

A safra mundial de soja deste ano, devido à seca da Argentina, terá um recuo de 10 milhões de toneladas, para 341 milhões, segundo estimativas do Usda.

Ou seja, mesmo com a quebra de safra no país vizinho, o mundo ainda tem muita soja. É preciso torcer para o apetite chinês aumentar ainda mais (Folha de S.Paulo, 22/3/18)

 


Seca implacável piora projeção de rendimento da soja argentina

A situação já parecia ruim para os produtores agrícolas argentinos prejudicados pela seca. Agora pode piorar ainda mais, porque a safra de soja do país corre o risco de atingir o menor nível em nove anos.

A estiagem implacável deixou os campos secos nos Pampas, principal região de cultivo do país. Os analistas agrícolas foram reduzindo as projeções para a produção durante toda a safra e com a seca prolongada as estimativas provavelmente cairão ainda mais.

Para entender o porquê, basta conversar com Ariel Striglio, um fazendeiro de 52 anos que cultiva terras nobres nos Pampas, perto de Chabás, na província de Santa Fé. Sua soja, de plantio tardio, está em mau estado. Com o crescimento fraco, algumas plantas não passam da altura da canela. Striglio reduziu sua projeção de rendimento pela metade desde o plantio.

“Só cobrirei os custos aqui”, disse, abrindo uma vagem verde para inspecionar as sementes do interior. A vagem, como muitas outras no campo seco, tinha apenas duas sementes. Em condições normais, teria três.

A seca gerou uma preocupação global em relação à oferta de farelo de soja porque a Argentina é a maior exportadora mundial da proteína produzida a partir da soja que é usada como ração animal. Os futuros do farelo em Chicago subiram 14 por cento neste ano devido ao aumento da volatilidade. Os ganhos podem resultar em custos maiores para produtoras de carne como a Tyson Foods e a chinesa WH Group.

Duas fases

A soja da Argentina é plantada em duas etapas. A maior parte dos grãos é plantada em outubro e novembro, na chamada semeadura precoce. Eles estão começando a ser colhidos agora. O terceiro terço, conhecido como semeadura tardia, é plantado em dezembro e no início de janeiro e colhido só em maio. Esses grãos tardios estão atualmente passando pela fase crítica de crescimento, que define o rendimento, sob condições de seca brutais, o que aumenta a especulação de que as estimativas para a produção continuarão caindo.

A Bolsa de Cereais de Buenos Aires deverá atualizar sua projeção para a colheita na quinta-feira. A bolsa já reduziu a estimativa para 42 milhões de toneladas, contra uma previsão de 51 milhões de toneladas no início de fevereiro.

“O piso pode ficar abaixo de 40 milhões”, disse Esteban Copati, analista-chefe de estimativas da bolsa, em entrevista por telefone, de Salliqueló, província de Buenos Aires. Se for assim, esta seria a menor safra desde pelo menos 2009.

A situação é tão ruim que alguns fazendeiros que têm gado nem se preocuparão em colher os grãos. Eles simplesmente usarão as plantas de soja arruinadas como forragem.

“Em algumas áreas as plantações já foram abandonadas”, disse Francisco Perkins, que cultiva cerca de 7.000 hectares de soja perto de Pehuajó, na província de Buenos Aires. Cerca de 2.000 hectares de sua plantação são semeadura tardia. As expectativas de rendimento desses grãos tardios caíram para 2 toneladas por hectare, contra uma previsão de 3,6 toneladas na época do plantio, disse ele (Bloomberg, 21/3/18)