Racha no governo: Palavra final sobre mistura do biodiesel veio de Lula
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Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), do qual fazem parte 17 ministérios, deliberou por manter a mistura de biodiesel ao diesel em 14%. Foto Marcelo Camargo - Agência Brasil
Presidente informou, na véspera, ministros Carlos Fávaro e Alexandre Silveira que momento não era adequado para elevar mistura a 15% por temer a inflação.
A decisão de manter a atual mistura de biodiesel ao diesel em 14% veio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que informou, na véspera, os ministros Carlos Fávaro (Agricultura) e Alexandre Silveira (Minas e Energia) que o momento não era o adequado para elevar a mistura a 15% em razão da inflação.
O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), do qual fazem parte 17 ministérios, deliberou por manter a mistura em 14%, o que decepcionou produtores do combustível renovável e de óleo de soja.
Em reunião preparatória na semana passada, na Casa Civil, técnicos da Fazenda alertaram para o impacto do aumento do óleo de soja e do etanol nos combustíveis e nos alimentos. No ano passado, o óleo de soja subiu quase 30% e o etanol, 18% – basicamente feito da cana-de-açúcar, ele também vem sendo fabricado a partir do milho.
Fávaro e Paulo Teixeira, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, conseguiram poupar o etanol, mas o biodiesel ficou na berlinda. Segundo relatos obtidos pelo Estadão, os números mostravam que o aumento da mistura de 14% para 15% iria, inegavelmente, produzir um aumento nas bombas.
Como mostrou o Estadão, nas contas do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), o aumento seria de R$ 0,02, num terceiro reajuste seguido – o primeiro devido ao aumento feito pela Petrobras em fevereiro e o segundo como resultado da tributação dos Estados.
Além disso, a Fazenda mencionou o potencial aumento das fraudes na mistura do biodiesel, o que levaria à competição desigual entre as distribuidoras que obedecem a lei e as que estão se desviando sem o controle da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
A decisão de Lula veio nesta segunda-feira, 17. Ministros afirmam que a preocupação maior neste momento é a inflação. As pesquisas de avaliação do governo mostram um descontentamento das classes de renda mais baixa com a administração de Lula, o que vem sendo atribuído aos aumentos de preços.
Racha
A resolução do Palácio não esconde, no entanto, a divisão que o assunto provocou no governo. Esse foi um dos motivos que levaram Fávaro a não comparecer à reunião do CNPE desta terça-feira – foi substituído pelo secretário-executivo-adjunto. Procurada, a assessoria do Ministério da Agricultura não se manifestou.
Fávaro tentou apresentar a Lula dados que mostravam que o preço do óleo de soja tende a cair, mas foi enquadrado pelo presidente e pelo chefe da Casa Civil, Rui Costa, numa reunião interrompida mais de uma vez por telefonemas da primeira-dama, Janja da Silva.
Marina Silva e Alexandre Silveira, adversários quando o assunto é a exploração de petróleo na Margem Equatorial, defenderam o biodiesel –Silveira, de maneira “moderada”, segundo a descrição de um dos participantes do CNPE. Geraldo Alckmin, do Ministério da Indústria, também ficou a favor da mistura a 15%.
Marina Silva e Alexandre Silveira, adversários quando o assunto é a exploração de petróleo na Margem Equatorial, defenderam o biodiesel.
No lado oposto, Casa Civil, Fazenda e Desenvolvimento Agrário foram firmes na maior preocupação com a inflação – não só a dos combustíveis mas também a dos alimentos.
O silêncio da Agricultura fez com que produtores fossem em peso ao encontro de Fávaro após a reunião do CNPE, onde conseguiram tirar dele o compromisso de que voltará a tentar retomar a discussão no governo em dois meses, além de agendar uma reunião do setor de biodiesel com o próprio Lula.
Os empresários querem provar que com o dólar mais baixo neste ano e a entrada da safra da soja, o preço do óleo deve cair.
Nesta segunda-feira, Lula esteve também com representantes do setor de petróleo e da Petrobras em Angra dos Reis (RJ). A indústria do combustível fóssil vem advogando pelo seu próprio “combustível verde”, chamado de coprocessado, porque a mistura é feita durante o refino do diesel.
A Petrobras tem um coprocessado com 5% de adição de biodiesel, mas foi alijada das metas do projeto do Combustível do Futuro, sancionado por Lula no ano passado, de ampliar até o fim da década os porcentuais renováveis. O embate que divide o governo divide também o setor produtivo (Estadão, 19/2/25)
Governo desiste de aumentar mistura do biodiesel em meio à alta da inflação
Silveira afirmou haver denúncias de que distribuidoras não estão fazendo a mistura de biodiesel ao diesel do porcentual correto
Mudança no porcentual da mistura de 14% para 15% estava prevista para ocorrer em 1º de março; governo quer evitar novas altas nos preços, diante da queda na popularidade do presidente Lula.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, confirmou nesta terça-feira, 18, a manutenção do porcentual mínimo obrigatório de biodiesel ao óleo diesel em 14% até “posterior deliberação”. A decisão foi tomada na primeira reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) em 2025.
No fim de 2023, o CNPE havia definido para março de 2024 a mistura de 14% de biodiesel ao diesel (B14), com a previsão de chegar a 15% (B15) em 2025. Além da redução da emissão de dióxido de carbono na atmosfera, foi citada a redução da importação do combustível fóssil.
Silveira defendeu um reforço da fiscalização da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Brasil (ANP) sobre a mistura em 14%. Ele citou deficiências na fiscalização do regulador e declarou que há denúncias de que algumas distribuidoras não estão fazendo a mistura. O ministro reiterou que a manutenção do porcentual não causa insegurança jurídica.
O motivo alegado nos bastidores para a manutenção da mistura nos níveis atuais é o potencial aumento do preço do óleo diesel ao consumidor. Após o preço do combustível subir mais de R$ 0,28 (R$ 0,22 pelo reajuste da Petrobras e R$ 0,06 pelo aumento do ICMS estadual), o governo quer evitar novas altas, em momento no qual o Palácio do Planalto está preocupado com a inflação resistente e com a queda na popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Outro argumento usado pelo governo é a alta de 29% do preço do óleo de soja em 2024, principal matéria-prima do biocombustível, e o receio de que a maior demanda do produto para produção de biocombustível poderá afetar o preço do óleo envasado, utilizado na alimentação.
O setor do biodiesel prevê impacto limitado, de R$ 0,01, no preço do óleo diesel na bomba a partir do aumento da mistura. Já distribuidoras de combustíveis estimam aumento de até R$ 0,02 no preço do óleo diesel ao consumidor a partir do maior teor de biodiesel.
Os fabricantes consideravam que não havia risco de mudança. Entidades do setor chegaram a intensificar conversas com integrantes do governo a fim de desmobilizar eventual alteração no cronograma.
As entidades do setor argumentam que impedir o aumento da mistura do biodiesel ao óleo diesel pode trazer impactos econômicos superiores ao aumento de R$ 0,01 no preço final do combustível. As usinas avaliam que qualquer mudança no cronograma previsto poderia desestruturar a cadeia produtiva do óleo e do farelo de soja.
Entre os efeitos potenciais avaliados pelo setor estão retração de investimentos já anunciados pelas usinas, consequente queda de geração de emprego e renda pela indústria, aumento da importação de diesel, o que afetaria balança comercial e aumento nos preços das carnes, em virtude de um possível menor esmagamento de soja e produção de farelo de soja — utilizado na alimentação animal.
Outro argumento é que a mudança no cronograma há menos de 15 dias antes da implementação traz perda de previsibilidade ao setor, que já tem contratos fechados com fornecedores considerando a evolução da mistura programada há mais de um ano. O setor de biocombustíveis também cobra do governo colocar em prática o que foi regulamentado na lei do Combustível do Futuro.
Do lado dos aspectos ambientais, o setor argumenta ao governo que a demonstração pública da adoção de uma matriz energética renovável torna-se ainda mais relevante no ano que o País sediará a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP-30) (Estadão, 19/2/25)
FPbio denuncia insegurança jurídica: Manter mistura de biodiesel em 14% é equivocado
‘A medida coloca em dúvida o real compromisso do Executivo com a agenda verde e a transição energética’, diz a FPBio, em nota sobre a decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), diz Frente Parlamentar.
Frente Parlamentar do Biodiesel (FPBio) criticou, em nota, a decisão do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) em manter a mistura de biodiesel no diesel fóssil em 14%. No fim de 2023, o CNPE havia definido para março de 2024 a mistura de 14% de biodiesel ao diesel (B14), com a previsão de chegar a 15% (B15) em 2025. Além da redução da emissão de dióxido de carbono na atmosfera, foi citada a redução da importação do combustível fóssil.
“A decisão (de adiar o aumento da mistura para 15%) é equivocada e contradiz o posicionamento do governo federal, autor da Lei do Combustível do Futuro — aprovada por unanimidade pelo Congresso e sancionada com festa em ato com a presença do presidente da República e representantes de todas as pastas”, criticou a bancada em nota, assinada pelo presidente, deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS). “A medida coloca em dúvida o real compromisso do Executivo com a agenda verde e a transição energética.”
Em nota assinada por seu presidente, Alceu Moreira, a FPBio diz que a adição de 1 ponto porcentual representaria aumento de R$ 0,01 no preço do combustível, mas em contrapartida 'reduziria o preço da carne, fortaleceria a balança comercial e os efeitos para a saúde pública e o meio ambiente'. Foto Marcelo Camargo - Agência Brasil
A FPBio afirma que o aumento da mistura para 15% a partir de 1º de março, conforme previsto em resolução do CNPE de dezembro de 2023, resultaria em aumento de R$ 0,01 no preço do óleo diesel nas bombas.
“Mas, por outro lado, reduziria o preço da carne, fortaleceria a balança comercial e os efeitos para a saúde pública e o meio ambiente. Os aumentos de ICMS e do petróleo importado, por exemplo, são de R$ 0,22. Nenhum desses efeitos, contudo, foram levados em conta”, argumentou a bancada do biodiesel.
Na avaliação da FPBio, a suspensão do cronograma de mistura vai comprometer empregos e investimentos de R$ 200 bilhões estimados pela indústria, em produção, frigoríficos, esmagadoras e usinas. “O setor do biodiesel acredita que o CNPE abre um precedente muito grave de insegurança jurídica e econômica para um segmento que sempre contribuiu com o País”, concluiu a FPBio na nota (Estadão, 19/2/25)
Biodiesel: adiamento do B15 compromete investimentos de todo o setor, critica Aprobio
Reunião do Conselho Nacional de Política Energética decidiu adiar o calendário da mistura do combustível renovável ao fóssil por tempo indeterminado.
O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) se reuniu nesta terça-feira (18) e decidiu adiar o calendário de evolução da mistura do biodiesel ao diesel fóssil estabelecido em dezembro de 2023. A medida, aprovada no Programa Combustível do Futuro, previa a adoção do teor de 15% (B15) a partir de 1 de março de 2025.
Agora, a mistura será mantida em 14% sem previsão de revisão, já que o tema será discutido na próxima reunião do Conselho, ainda sem data definida.
A Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio) criticou o parecer, destacando repercussões negativas em toda a cadeia do setor.
“Parecia inconcebível ter uma quebra de compromisso estabelecido pelo país nesse processo de transição energética a partir da aprovação do Combustível do Futuro, mas uma visão equivocada do impacto da evolução da mistura de biodiesel na inflação vai comprometer o desempenho em toda a cadeia produtiva, colocando em risco altos volumes de investimentos anunciados”, disse o presidente da entidade, Francisco Turra.
Queda do preço do biodiesel
O setor destacou que o valor do biodiesel está em queda em função da redução do valor do óleo de soja e da desvalorização do dólar.
Assim, em nota, a Aprobio ressalta que não há nenhum vínculo entre o aumento do uso de biodiesel e o preço do óleo de soja, mas sim um impacto real da decisão nos planos de investimentos anunciados pelo setor produtivo, com reflexos para a agricultura familiar e para a competitividade dos preços de alimentos que dependem do farelo de soja para as rações animais.
“Não é possível afetar toda uma cadeia produtiva com 15 dias antes da decisão esperada de aumento de mistura. As empresas empenharam seus compromissos com aquisição de matéria-prima e prepararam a estrutura produtiva para uma ampliação de oferta em cerca de 7%, que, de uma hora para outra, é cancelada”, detalhou Turra.
De acordo com o presidente da Associação, este não é o primeiro desafio enfrentado pelo setor em 20 anos de história que, “mais uma vez, estará unido para reverter essa decisão em favor de um país mais saudável, reduzindo as condições de eventos climáticos extremos que tanto prejudicaram o país, com imensos prejuízos, e tantas vidas levaram” (Canal Rural, 18/2/25)
Fávaro diz que implementação do B15 pode ser feita nos próximos 60 dias
BIODIESEL Foto Governo Federal
Ministro afirmou que decisão está atrelada à queda de preço do óleo de cozinha e à concretização da supersafra de soja.
O ministro da Agricultura e Pecuária (Mapa), Carlos Fávaro, afirmou que a expectativa da pasta é de que o cronograma de 15% de mistura de biodiesel ao óleo diesel possa ser retomado na próxima reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), considerando a perspectiva de acomodação do preço do óleo de soja.
“Com o início da safra, o preço do óleo de soja já começou a cair, mas precisamos agir com cautela. O adiamento do B15 vai permitir a maior disponibilidade de óleo de soja no mercado, não havendo disputa com óleo de cozinha, e a queda do preço do óleo de soja”, disse a jornalistas após reunião com o setor do biodiesel nesta terça-feira (18).
“Com a acomodação do preço do óleo de soja nas gôndolas dos supermercados, talvez possa ser possível fazer a mistura de B15 dentro de 60 dias”, afirmou.
Adiamento da mistura
O encontro ocorreu após o CNPE manter a mistura do biodiesel ao óleo diesel em 14%, derrubando o cronograma previsto da mistura de 15% para 1º de março. O ministro afirmou que a decisão do governo pela manutenção da mistura deve-se ao aumento significativo do preço do óleo de soja no ano passado após a quebra na safra nacional com eventos climáticos adversos.
“Em função da crise hídrica no ano passado, houve redução da safra de soja, ao mesmo tempo em que os estímulos ao biodiesel foram retomados e, com isso, houve descasamento no excedente de óleo para biodiesel e óleo na gôndola do supermercado. Houve aumento bastante significativo do preço do óleo de soja na gôndola do supermercados. A prioridade é com a alimentação do ser humano”, acrescentou Fávaro.
Segundo o ministro, o preço do óleo de soja ao consumidor e a oferta de óleo de soja nos supermercados são uma preocupação do presidente Lula. “Estamos demonstrando a ele que vivemos um momento diferente com super safra devendo colher 18 milhões de toneladas a mais de soja, o que vai aumentar o volume de óleo disponível”, destacou.
Apesar de os preços de óleo de soja já estarem caindo, Fávaro afirmou que o governo tem de agir com cautela e esperar a queda realmente chegar ao mercado.
“Talvez a adoção de B15 em momento que a indústria planeja suas compras de matéria-prima, ao fim de fevereiro, poderia quebrar esse ciclo de retração de preços comprando mais óleo para suprir 1 ponto porcentual mais de mistura. É necessário ter cautela”, ponderou.
Importância do combustível renovável
O ministro reforçou, ao lado de dirigentes da indústria, que o governo Lula tem compromisso com biocombustíveis e com a energia renovável, lembrando que foi o presidente Lula em seu primeiro mandato que criou o Programa Nacional de Biodiesel em 2004.
“O governo passado vinha desestimulando o programa do biodiesel, retrocedendo a B10 e priorizando a importação de diesel S500. O governo Lula entende a importância do combustível renovável, do biodiesel. O governo Lula entende que o óleo ajuda na formação de preço do farelo de soja que se transforma em carne”, disse à imprensa.
De acordo com o ministro, o setor de biodiesel deve se encontrar na próxima semana com o presidente Lula. Caso haja disponibilidade de agenda, o encontro pode ocorrer na próxima quarta-feira (26).
Ao fim de janeiro, Lula sinalizou que queria explicações do setor sobre a relação do preço do óleo de soja, que subiu 29% em 2024, com a maior demanda por biodiesel. “Eu quero saber se a soja para o biodiesel está criando problema; quero saber se o milho para o etanol está criando problema. Só posso saber disso se chamar os empresários da área para conversar, ao invés de ficar falando da coisa sem ter conhecimento”, disse Lula em coletiva de imprensa na época.
O encontro é articulado por Fávaro e deve contar com a presença do empresário e ex-ministro da Agricultura, Blairo Maggi, um dos principais interlocutores do governo Lula com o agronegócio. O ministro Alckmin e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, também devem comparecer (Canal Rural, 18/2/25)