Reflorestamento e geração elétrica – Por Pietro Erber
Pelo Acordo de Paris, firmado em 2015, o Brasil se comprometeu a desempenhar relevante papel na contenção do aquecimento global. Dentre os compromissos assumidos e previstos para serem implementados até 2030, estão o plantio de 12 milhões de hectares de florestas, a recuperação de 15 milhões de hectares de terras degradadas, também com reflorestamento e o aumento da participação de fontes renováveis não hídricas, para atingir a meta de 23% da geração de energia elétrica.
Em janeiro de 2017 foi criada a Proveg – Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, tendo por meta "restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares até 2030". Cabe avaliar os requisitos que propiciem a viabilidade dessa oportuna iniciativa.
A formação dessas florestas acarretará expressiva absorção de carbono atmosférico e seu manejo sustentável proporcionará importante oferta de combustível renovável não sazonal nem intermitente, que poderá ser utilizado para gerar energia elétrica, evitando consumo de combustíveis fósseis.
O primeiro corte das árvores (eucalipto) é feito 6 a 7 anos após seu plantio. Os cortes seguintes são feitos a cada sete anos. Dessa forma, em 2030, dos 12 milhões de hectares previstos, já estarão disponíveis para serem aproveitados 6 a 7 milhões de hectares, pois se considera que será plantado cerca de 1 milhão de hectares a cada ano. Como se deseja examinar a viabilidade das áreas florestais a serem plantadas, não se consideram os 6,5 milhões de hectares de florestas plantadas atualmente existentes.
Estima-se que a produção florestal média anual disponível para uso seja da ordem de 26 toneladas por hectare e que se consuma cerca de uma tonelada de madeira para gerar 1 MWh. Assim a exploração sustentável de uma floresta de 12 milhões de hectares ensejaria a geração anual de cerca de 300 TWh por usinas que somariam 44 mil MW de capacidade instalada, operando com fator de capacidade médio anual de 80%. Se essa geração evitar o consumo de gás natural em termelétricas, a redução das emissões anuais devidas ao setor elétrico seria de perto de 500 milhões de toneladas de CO2 eq.
Em 2030 a geração elétrica dessa produção florestal e as emissões evitadas alcançariam cerca da metade desses valores, visto que as árvores plantadas após 2023 ainda não teriam crescido a ponto de serem aproveitadas.
O plantio previsto terá custo expressivo, perto de R$ 80 bilhões até 2030. Seu financiamento ainda não está assegurado, o que poderá limitar a viabilidade desse grande projeto e a credibilidade dos resultados previstos. A biomassa que se pretende criar precisa ser utilizada para gerar recursos que assegurem seu plantio, produção inicial e manejo sustentável. A geração de energia elétrica constitui uma solução competitiva, que dispensa subsídios, pois pode ser obtida a um custo médio da ordem de R$ 200 por MWh, semelhante ou mesmo inferior aos preços cotados nos últimos leilões de suprimento de energia elétrica por usinas cuja produção seja controlável.
Geração de energia elétrica com biomassa florestal é solução competitiva, que dispensa subsídios
As usinas a biomassa florestal, cuja potência é geralmente de 50 a 150 MW, serão instaladas em diversas áreas do território nacional, preferencialmente em pontos próximos a linhas de transmissão. Poderão utilizar tecnologia disponível no país, inclusive ensejar a recuperação de indústrias de caldeiras e turbo-geradores que foram prejudicadas pela crise do setor sucroenergético, decorrente da artificialidade dos preços da gasolina em anos recentes.
O vulto dessa iniciativa com a qual o Estado brasileiro está comprometido exige o suporte de um programa de governo, que coordene as atividades e promova seu financiamento, além de dar garantias aos investidores para que, nos anos iniciais de sua operação, tenham mercado remunerador para a energia gerada. Será necessário que a oferta de energia elétrica decorrente da implementação desse programa esteja contemplada nos planos oficiais de expansão da oferta dessa energia e que as condições de financiamento sejam compatíveis com os longos períodos de maturação de tais investimentos, de pelo menos sete anos. Para tanto, será indispensável evitar projetos cuja viabilidade não seja confiável.
Inicialmente será necessário identificar e mobilizar os potenciais interessados. A eles caberá implementar o plantio florestal previsto como empreendimento agroindustrial autossustentável, pois a perspectiva de retorno será necessária à sua viabilidade. Nesse sentido, caso nem toda a biomassa florestal venha a ser destinada à geração elétrica, parte poderia ser destinada a indústrias, como a siderúrgica, e assim reduzir seu consumo de combustíveis fósseis.
Cabe considerar que, por representar valores potenciais, parte da crescente e expressiva oferta de energia elétrica gerada a partir de biomassa florestal plantada, acima estimada, poderá vir a ser substituída por outras modalidades de geração, apesar das vantagens que apresenta mesmo em relação a outras fontes renováveis. Além de fatores econômicos que em algumas situações prejudiquem sua competitividade, a biomassa florestal carece do apoio que algumas fontes renováveis vêm recebendo, inclusive no e do exterior.
A exploração da biomassa florestal envolve atividades permanentes, que precedem o plantio e alcançam a comercialização de seus produtos. A coordenação dessas atividades requererá apoio governamental, federal e estadual, e será necessário que envolva também, além dos principais órgãos de política energética, industrial e econômica, associações de plantadores de florestas e operadores do setor elétrico. Dado o interesse mundial em projetos redutores de emissões de gases de efeito-estufa, agências multilaterais como o Bird, o IFC e o BID poderiam prestar seu apoio.
Não se trata de uma ideia que se materialize espontaneamente, pela força de seus aspectos favoráveis. Requer empenho governamental, organização, recursos e ampla aceitação pública, pois competirá com grande oferta de gás natural, além de outras energias renováveis, cujos custos diretos têm diminuído. O plantio de 12 milhões de hectares de florestas até 2030, que se somarão aos 6 milhões já disponíveis, será viável se, além de criar uma oportunidade de fornecer, de forma sustentável, substancial quantidade de energia, apresentar a rentabilidade necessária para assegurar sua realização (Pietro Erber é diretor do Instituto Nacional de Eficiência Energética)