Reforma tributária – Por Antonio Delfim Netto
Para retomar o crescimento robusto, são necessárias mudanças que tornem mais competitiva nossa economia.
Quando olhamos o funcionamento da sociedade e sua ligação difusa e porosa com os mecanismos que produzem a sua subsistência material, estamos diante de um profundo mistério. Como, por exemplo, os produtores de sapatos “sabem” (sem o comando de uma autoridade) quantos, de que tamanho e que tipos devem produzir para atender à demanda? Qual sinal os informa?
Talvez a mais espetacular descoberta dos economistas tenha sido que o sinal é o sistema de preços do mercado, que reduz a demanda pela restrição da renda do consumidor e aumenta o incentivo dos produtores quando os preços sobem, o que restabelece o equilíbrio.
Quanto menor a interferência externa na formação dos preços em mercados competitivos, mais os preços estabelecidos refletem o seu “custo de oportunidade”, ou seja, o maior valor que poderia ser produzido de outros bens com os mesmos fatores de produção nele utilizados, o que significa que estamos no ponto ótimo de sua utilização. É por isso que a primeira qualidade de um sistema tributário é não interferir na formação dos preços competitivos.
Nosso problema, entretanto, é como fazer para retomar o crescimento robusto, única solução para o mais grave problema nacional: 13 milhões de desempregados? A resposta é fazer reformas que tornem mais competitiva nossa economia.
Na reforma da Previdência, o Executivo forneceu a diretriz, sem comprometer-se com ela. Foi politicamente “ajustada” na Câmara com o entusiasmado apoio de seu presidente, o ilustre deputado Rodrigo Maia, na montagem estratégica das comissões e na escolha inteligente dos atores principais.
No caso da reforma tributária, o quadro é muito diferente. A Câmara assumiu seu protagonismo apoiado no projeto do deputado Baleia Rossi/Appy, a PEC 45/2019; o Senado parece flertar com a PEC 293/2004, de autoria do ilustre ex-deputado Luiz Carlos Hauly, e o Executivo continua fechado em copas, mas revelou um apoio a um IVA Federal que admite a assimilação posterior de entes subnacionais com alíquotas por estes fixadas, o modelo canadense, o que supera possíveis objeções constitucionais à PEC 45/2019, mas namora um equivocado imposto sobre transações.
O melhor seria o ministro Guedes assumir o protagonismo da discussão e convidar um ou dois consagrados tributaristas canadenses comprometidos com a reforma que fizeram e promover um simpósio com tributaristas e economistas nacionais para apresentar ao Congresso uma só diretriz. Esse, com seu novo e bem-vindo protagonismo, a ajustaria politicamente para tentar obter o mesmo sucesso da reforma da Previdência (Antonio Delfim Netto é economista, ex-ministro da Fazenda (1967 – 1974); Folha de S.Paulo, 31/7/19)