Reversão do otimismo – Por Roberto Rodrigues
Produtores terão resultados muito heterogêneos, o que não é bom para o futuro.
A Organização das Cooperativas Brasileiras e a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) produzem trimestralmente o Índice de Confiança do Agronegócio, medindo o “ânimo” do setor considerado em suas três vertentes: a indústria que vem “antes da porteira” das fazendas (são os fabricantes de insumos e máquinas/equipamentos para o campo), o “dentro da porteira”, que é a atividade produtiva rural propriamente dita (que vai do preparo do solo para plantio até a colheita) e o que vem “depois da porteira” (indústria de alimentos, embalagem, distribuição e comércio).
A metodologia adotada pelo trabalho estabelece que índices superiores a 100 mostram otimismo, e abaixo de 100 um baixo grau de confiança.
Muito significativo foi o índice do Produtor Agrícola, que chegou a 107,2 pontos, uma alta de 3,2 pontos sobre o último trimestre de 2017, que já tinha melhorado em relação ao anterior. Este é o maior valor da série histórica para o primeiro trimestre de cada ano. Tal otimismo reflete a boa produtividade agrícola dos grãos na safra colhida, somada a uma melhora dos preços por causa da quebra da produção argentina em função da seca lá vivida: este é o melhor dos mundos no campo, combinação de bom volume colhido com preços acima dos previstos.
A confiança dos agricultores, todavia, não se repete entre os pecuaristas, cujo índice ficou em apenas 96,2 pontos. No caso dos produtores de carne, isso se explica pelos problemas oriundos da Operação Carne Fraca, em maio do ano passado, e da Operação Trapaça deste ano. Muitas processadoras de carne de frangos e de suínos tiveram suas exportações para a Europa suspensas. Com isso, essas indústrias tiveram de descarregar seus estoques no mercado interno, derrubando os preços.
Não se sabe ainda quanto tempo durará o embargo às exportações, que claramente é uma ação comercial protecionista dos europeus, mas infelizmente nossas falhas no sistema de defesa sanitária deram a oportunidade para essa atitude.
Uma consequência direta disso tudo é os produtores rurais diminuírem o alojamento de pintinhos e leitões para engorda: com margem negativa na venda dos animais adultos, é natural que isso aconteça. E tal redução acaba determinando menor consumo de milho e farelo de soja. Seria provável, então, que os preços desses produtos também caíssem, com prejuízos para toda a cadeia produtiva das carnes, com a corda estourando do lado mais fraco, o agropecuarista.
Para o bem e para o mal, no entanto, as chuvas, que foram generosas até o começo de março, escassearam de lá para cá, afetando com força a produtividade do milho de segunda safra, especialmente em áreas expressivas do Paraná e do Mato Grosso. A queda da produção e do grão reduz a renda dos produtores dessas regiões, mas, em compensação, os preços não desabam, como seria natural com a diminuição da demanda: a oferta também cai.
Esse cenário complexo traz um resultado desigual: quem colher bem terá margem positiva, mas quem for afetado pela seca terá prejuízo. Tal disparidade poderá impactar negativamente o Índice de Confiança do segundo trimestre para o pessoal de grãos e carnes. Para os produtores de laranja e de cana de açúcar que estão sem chuvas no Sudeste, os prejuízos já são consideráveis.
No caso da cana, espera-se uma quebra de produtividade em torno de 10% este ano, com a agravante de preços muito baixos por causa da crescente oferta mundial de açúcar (alta produção na Índia, graças aos pesados subsídios lá concedidos aos produtores).
Já as estimativas de redução de safra de laranja em São Paulo e triângulo mineiro chegam a 27,6% em relação à safra passada.
Por fim, com o cenário político nacional muito incerto e a crescente insegurança no campo (com assaltos e roubos feitos por quadrilhas bem organizadas no País todo), não será surpresa uma reversão no otimismo dos produtores rurais. Mesmo que o setor continue ajudando o crescimento do País, os seus atores terão resultados muito heterogêneos, o que não é bom para o futuro (Roberto Rodrigues é ex-ministro da Agricultura e coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas; O Estado de S.Paulo, 13/5/18)