Sequência de crises leva avicultura do céu ao inferno em pouco tempo
Setor passou por problemas internos, como a operação da PF, e externos, como taxação à carne.
Há três anos o Brasil vivia o auge da avicultura. A produção do setor superava 13 milhões de toneladas, e o país, o líder mundial em exportações, assumia a segunda posição na produção mundial, desbancando a China.
O Brasil iria, porém, do céu ao inferno em pouco tempo. Um dos poucos no mundo a não registrar problemas de sanidade animal, o que ocorreu com seus concorrentes diretos, o país viria a enfrentar vários problemas internos.
O próprio setor começava a colocar barreiras na caminhada de sucesso que vinha imprimindo nos anos recentes. Foram percalços que poderiam ser evitados.
Um dos primeiros tropeços foi em 2016, quando a safrinha, a principal safra de milho do país, quebrou em 25%. A oferta de milho no mercado nacional, que tinha sido de 97 milhões de toneladas em 2015, recuou para 80 milhões no ano seguinte.
Sem uma programação de estoques e contratos de compra, as empresas do setor foram obrigadas a pagar, em média, R$ 54 pela saca de milho em junho de 2016. Algumas, dependendo da região, chegaram a pagar R$ 70.
O resultado foi um rombo nos custos de produção. Um ano depois, a saca de milho recuava para R$ 26.
Ainda sem se recuperar da pressão dos custos do milho, as empresas do setor foram seriamente afetadas pela Operação Carne Fraca de 2017.
Como consequência, boa parte do mercado externo se fecharia ao produto brasileiro. Enquanto o mercado externo encurtava, o interno também diminuía, devido à recessão.
O setor ainda se recuperava dos baques anteriores quando veio a segunda fase da Operação Carne Fraca, que expunha práticas de produção nada confiáveis por parte de algumas empresas.
Em vista de sanções de países importadores, o governo impôs uma autossuspensão a alguns frigoríficos. Na sequência, foi a própria União Europeia, responsável pela compra de 10% de nossas exportações, que colocou barreiras ao produto brasileiro.
O resultado foi que a Tailândia, pela primeira vez, desbancou a liderança brasileira no bloco europeu, assumindo o posto de maior exportador para a União Europeia.
Tradicional exportador para o Oriente Médio, o país começou a ter problemas também com os importadores daquela região. A Arábia Saudita, que fica com 14% das exportações brasileiras, exigiu mudanças no sistema de abate.
Por uma questão religiosa, os árabes não querem que o frango receba um choque antes de ser abatido.
Os Emirados Árabes Unidos, que importam 7% da carne brasileira colocada no mercado externo, seguiram a Arábia Saudita.
As discussões ainda persistem e, provavelmente, vão trazer mais custos às empresas.
Ainda sem respirar dos problemas anteriores, o setor foi gravemente afetado pela paralisação dos caminhoneiros. Sem receber insumos para uma continuidade da produção, a avicultura viu suas operações serem totalmente interrompidas e a morte de pelo menos 70 milhões de aves.
O estrago foi tão grande que os efeitos da parada deverão continuar no ritmo de produção e nas finanças das empresas pelos próximos meses.
Quando o setor buscava saídas para os estragos provocados pelo ato dos caminhoneiros, recebeu a notícia da taxação da China de 18,8% a 38,4% sobre o frango brasileiro.
Dificuldades comerciais na União Europeia, no Oriente Médio e na China, principais regiões importadores do produto brasileiro, podem tornar este um dos piores anos para o setor.
Com relação às barreiras colocadas pelos importadores, o Brasil pouco pode fazer, a não ser negociar muito. Os deslizes internos na produção e na fiscalização, porém, poderiam ser evitados.
A avicultura atingiu importância muito grande, e qualquer contratempo no setor afeta boa parte da economia. As exportações somaram 4,3 milhões de toneladas em 2017, com receita de US$ 7,2 bilhões (Folha de S.Paulo, 12/6/18)
Greve faz preço do frango disparar no país
Um dos segmentos do agronegócio mais prejudicados pela greve dos caminhoneiros, a avicultura já cobra seu preço pelos mais de 70 milhões de pintinhos sacrificados nos dez dias de paralisação. Diante da queda dos estoques no atacado e da dificuldade dos frigoríficos de se reabastecerem, a carne de frango subiu mais de 40% em junho no atacado.
A tendência é que o preço se consolide em níveis mais altos do que os vistos no primeiro trimestre do ano, sobretudo porque o alojamento de pintinhos (indicador da produção futura de carne) nas granjas caminha para bater, pelo segundo mês consecutivo, o menor volume diário nesta década.
Na prática, a greve dos caminhoneiros intensificou o movimento de redução da produção que teve início em abril por conta do milho mais caro e do embargo da União Europeia a 20 frigoríficos do país.
“Nunca produzimos tão pouco”, disse o secretário-executivo da Associação Brasileira dos Produtores de Pintos de Corte (Apinco), José Carlos Godoy. Conforme os dados da associação, 469.8 milhões de pintinhos foram alojados nas granjas do país em abril, com queda de 7,6% na comparação anual. Considerando os alojamentos diários, foram 15.6 milhões de aves.
Segundo o analista do Rabobank Adolfo Fontes, o fluxo de produção de carne de frango só deverá se normalizar dentro de 30 a 60 dias. O pico dos preços talvez dure apenas duas semanas, disse. Mas isso não significa que as cotações do frango ficarão bem mais baixas, ponderou.
Ainda que a alta de 40% seja momentânea e dure até que o estoque se ajuste, a redução da oferta de frango e a cotação dos grãos, principal custo de produção do setor, impulsionam os preços. Tanto é assim que, antes da greve, o frango já havia subido cerca de 15% em maio.
Pelas contas de um executivo de uma grande indústria de carne de frango do País, o alojamento de pintos de corte deve ter ficado por volta de 450 milhões de cabeças em maio. Segundo Godoy, da Apinco, os números ainda não foram fechados, mas é certo que, ao menos o volume diário será menor do que o de abril. Como o mês de maio tem mais dias do que abril, é possível que os alojamentos mensais não sejam menores, disse.
Em meio ao quadro negativo para a produção, o Rabobank revisou sua estimativa e agora prevê queda de 3% na produção brasileira de carne de frango em 2018. No início do ano, o banco holandês estimava um crescimento de 2%, segundo Adolfo Fontes. No ano passado, os frigoríficos brasileiros produziram 13 milhões de toneladas de carne de frango, de acordo com a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
Na avaliação de Ricardo Santin, vice-presidente de mercados da ABPA, a tarifa antidumping aplicada pela China contra a carne de frango brasileira não será capaz de alterar o quadro mais apertado previsto para a oferta no mercado doméstico. Isso porque o país asiático compra principalmente pé de frango, corte pouco demandado no Brasil.
Para Santin, a tendência é que os frigoríficos brasileiros continuem vendendo aos chineses, mesmo com a rentabilidade prejudicada pelas novas tarifas. Se assim for, não haverá sobras de pés de frango. E, mesmo que os embarques à China diminuiam, os pés de frango não inundarão os supermercados, mas serão transformados em ração para cães e gatos. Em outras palavras, a China não será responsável por aliviar o preço da carne de frango para os brasileiros.
Se é negativa para os consumidores, a redução da oferta de frango pode ser uma luz no fim do túnel para os frigoríficos. “A rentabilidade da indústria acabará melhorando no segundo semestre”, disse o analista do Rabobank. De quebra, a alta dos preços do frango pode ajudar os frigoríficos de carne bovina, que sofreram ao longo do primeiro semestre deste ano para concorrer pela preferência dos consumidores.
Segundo o Rabobank, em boa parte deste primeiro semestre era possível comprar mais de três quilos de carne de frango pelo preço de um quilo de carne bovina. Agora, com a recuperação do preço da ave, essa relação caiu para cerca de 2,5 quilos de frango para um quilo de carne bovina (Assessoria de Comunicação, 11/6/18)