11/02/2019

Tem de dar certo! – Por Roberto Rodrigues

Tem de dar certo! – Por Roberto Rodrigues

Interesses setoriais devem criar dificuldade para aprovar a reforma da Previdência.

Já se foram 40 dias de governo Bolsonaro e outros 10 dias de novas chefias nas duas Casas legislativas federais. Muito pouco tempo para fazer avaliações profundas, mas temos alguns bons indicadores.

A agenda do novo governo é ambiciosa, sobretudo na área econômica, o que torna sua tarefa mais complexa depois do bom legado do governo passado que começa com o teto de gastos totais da União, passando por inflação abaixo da meta, taxa Selic de 6,5% ao ano, reservas internacionais de US$ 380 bilhões, projetos em andamento para concessões de infraestrutura (rodovias, ferrovias e portos) e propostas de reformas encaminhadas ao Congresso. Mas implementar a tal agenda ambiciosa com as reformas indispensáveis e proceder às privatizações vai implicar complexas negociações – com um Parlamento muito renovado – que passam por mudanças na Constituição, novas leis complementares e ordinárias urgentes e em parte simultâneas.

A reforma da Previdência parece hoje uma unanimidade, como deveria ser. Só que não: interesses setoriais ainda vão criar dificuldades. Mas um ponto positivo e importante foi a eleição dos presidentes da Câmara do Deputados e do Senado, ambos aparentemente convencidos da necessidade das reformas prioritárias: as negociações para suas eleições foram bem articuladas entre as lideranças do governo e dos parlamentares, e essa articulação necessária traz esperança de avanços. Mas só esperança não basta. Tem de dar certo, e, para tanto, temos de ajudar, todos os brasileiros de boa vontade, pois é preciso agora, mais do que nunca, entregar anéis para não perder dedos e braços logo adiante.

O campo está convencido disso. Sua esperança está sacramentada no Índice de Confiança do Agronegócio referente ao quarto trimestre de 2018, superpositivo, da ordem de 115,8% (o índice 100 equivale ao ponto neutro), mesmo que o setor esteja perdendo dedos, como se observa com nosso principal produto agrícola, a soja.

Estamos em plena colheita da safra de verão. Em algumas regiões teremos uma boa produção de soja e a promessa de grande plantio da segunda safra de milho: começou a chover mais cedo no ano passado, o que possibilitou antecipar o plantio da soja e sua colheita, abrindo uma “janela” maior para o milho de inverno, que dependerá do clima, hoje incerto. O destaque positivo fica com Mato Grosso, nosso maior Estado produtor de cereais, com safra cheia no verão e perspectivas razoáveis para a de inverno.

Mas em outras regiões o famigerado El Niño andou prejudicando as lavouras anuais. Nos Estados do Sudeste e do Sul, a chuva foi irregular e mal distribuída, assim como em Goiás e no Matopiba, de modo que já se prevê uma quebra significativa do volume nacional soja. Especialistas apontam para uma redução de 10% a 15% sobre a estimativa inicial, que seria recorde, de 123 milhões de toneladas.

A participação brasileira no comércio mundial da soja é da ordem de 81% segundo o USDA, de modo que uma quebra de mais de 12 milhões de toneladas, deveria já ter induzido um aumento de preços da importante leguminosa, dado o fato de que a demanda global, notadamente a chinesa, não sofreu redução. Mas isso não está acontecendo. Ora, com produção menor e sem preços maiores, cai a renda do produtor, que acaba demorando mais para vender sua safra, esperando melhora do mercado. Os custos de produção subiram muito do ano passado para este, pelo aumento de preço de insumos e muito mais pela famosa tabela de fretes, resultado da greve dos caminhoneiros em maio passado. E isso explicaria um fato correlato que está acontecendo, que é o atraso na compra de fertilizantes, com um “efeito dominó” ruim para toda a cadeia produtiva.

Com isso, e também com os preços baixos do café e mais a quebra de produção de cana em função da seca, o agro está mesmo perdendo renda, e não é pouco. Mas o setor acredita no ano que vem e nos próximos e, por isso, está esperançoso e confiante no futuro. Tem de dar certo! (Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e coordenador do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas; O Estado de S.Paulo, 10/2/19)