Tempestade perfeita no campo provoca queda recorde do PIB da agropecuária
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Crise hídrica, geadas e produtividade menor provocam recuo de 9% no desempenho do setor no terceiro trimestre.
Por Mauro Zafalon
Responsável pela coluna Vaivém das Commodities, é formado em jornalismo e em ciências sociais.
A agropecuária prometia dar um novo impulso ao PIB (Produto Interno Bruto) neste ano, mas chega ao terceiro trimestre como um dos principais entraves ao crescimento geral da economia.
O setor tem uma queda recorde de 9% para esse período, em relação ao terceiro trimestre de 2020, e acumula recuo de 0,1% no ano.
Os dados foram divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nesta quinta-feira (2). O instituto mostra que o PIB geral cresceu 4% de julho a setembro, em relação a igual período do ano passado.
O resultado da agropecuária é ruim porque o setor viveu uma tempestade perfeita nesta safra. No setor agrícola, plantio atrasado, crise hídrica e geadas impediram a supersafra esperada para 2021.
GADO Foto Martin Zabala - Xinhua
Ao contrário, o setor termina o período da safra 2020/21 com apenas 251 milhões de toneladas de grãos, nos números do IBGE.
A pecuária, outro setor importante na formação do PIB, também não teve seus melhores dias. Os dados mais recentes do IBGE indicam que os abates de bovinos deste terceiro trimestre foram 11% inferiores aos de igual período do ano passado.
Além de ser afetada pela seca, a pecuária teve uma forte redução de animais para abate, o que elevou os preços internos, ajudados ainda pela demanda chinesa.
A captação de leite caiu 5,1% no trimestre, e a produção de ovos, um substituo às carnes, recuou 2,5%. Já os setores de suinocultura e de avicultura, incentivados pelas exportações, aumentaram os abates no período.
A seca e as diversas geadas que afetaram as lavouras frustraram a perspectiva de uma grande safra, principalmente nos produtos de inverno. Com isso, acabaram afetando o desempenho do PIB agropecuário neste terceiro trimestre.
O milho foi um dos principais destaques nessa quebra, com redução de 21% na produção no período da safrinha, a de maior volume para o país. Isso reduziu a safra total do ano em 17 milhões de toneladas, em relação à anterior, conforme os números do IBGE.
A redução de 32% na produção de café arábica também pesou muito na formação do PIB agrícola. A cultura, além de ser afetada por geadas, o que deverá refletir ainda mais na safra de 2022, passou pela bienalidade negativa. Ou seja, após uma safra abundante, como foi a de 2020, as árvores perdem força e produzem menos no ano seguinte.
O grande problema da safra deste ano foi a perda de produtividade. No caso do milho semeado na safrinha, a redução foi de 26,5%, enquanto a produtividade do café arábica recuou 28,5%.
O algodão, outro importante componente da safra agrícola neste período do ano, teve uma redução de 17% na produção e de 2% na produtividade. O volume colhido foi reduzido para 5,85 milhões de toneladas do produto em caroço.
A cana-de-açúcar, também afetada por seca e por geadas, teve uma perda de 7,6% na produção, que recuou para 626 milhões de toneladas, e de 5,2% na produtividade.
Já a laranja, conforme as previsões feitas em outubro pelo IBGE, perde 14% na produtividade e no volume produzido.
O destaque positivo neste período do ano ficou para o trigo, cuja produção deverá atingir 7,83 milhões de toneladas, 26% a mais do que em 2020.
O PIB agropecuário ficará distante da projeção de 3%, prevista no início do ano. O quarto trimestre não tem nenhum fator de peso como influência positiva, à exceção dos setores de carnes suína e de aves.
O consumo interno e as exportações dessas duas proteínas devem melhorar neste quarto trimestre, devido à demanda do final de ano, mas o setor de bovinos continua com restrições na oferta.
A agropecuária conseguiu uma participação importante de 6,8% na formação do PIB brasileiro em 2020. Esse percentual, porém, não deverá ser mantido em 2021 (Mauro Zafalon é responsável pela coluna Vaivém das Commodities, é formado em jornalismo e em ciências sociais Folha de S.Paulo, 3/12/21)
Entenda a queda de 8% da agropecuária no PIB
Secas, geadas e fim da safra de soja influenciaram resultado.
A queda da agropecuária no PIB (Produto Interno Bruto) do terceiro trimestre reflete uma combinação de fatores que inclui efeitos sazonais, base de comparação elevada e prejuízos do clima adverso no país, indicou nesta quinta-feira (2) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
O setor caiu 8% na comparação com os três meses imediatamente anteriores. É a maior redução desde o primeiro trimestre de 2012, quando houve tombo de 19,6%. Com o impacto negativo do campo, o PIB nacional recuou 0,1% entre julho e setembro.
Segundo o IBGE, a baixa da agropecuária reflete, em grande parte, o fim da safra de soja, que também impactou exportações. A colheita da principal commodity agrícola do país está mais concentrada nos dois primeiros trimestres do ano.
Assim, a produção do setor tende a ficar menor a partir de julho, explicou a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis.
No terceiro trimestre, o Brasil também amargou períodos de seca e geadas. Em conjunto, os fatores extremos prejudicaram o plantio e a produtividade de vários segmentos, incluindo café, milho e cana-de-açúcar.
"A agropecuária vem de uma base de comparação alta, já que foi a atividade que mais cresceu no período de pandemia e, para este ano, as perspectivas não foram tão positivas, em ano de bienalidade negativa para o café e com a ocorrência de fatores climáticos adversos na época do plantio de alguns grãos", apontou a analista do IBGE.
O pesquisador Felippe Serigati, do centro de estudos FGV Agro, também chama atenção para o impacto do clima no desempenho do setor. "Isso pegou trigo, milho, café e hortaliças, por exemplo."
Segundo o especialista, o cenário para a agropecuária tende a ser mais positivo em 2022, a partir de melhores condições climáticas. Por outro lado, o pesquisador relata que o setor deve seguir pressionado por questões como a alta dos preços de parte dos insumos. Entre eles, estão adubos e fertilizantes.
"Os mapas meteorológicos são mais favoráveis para 2022, mas é óbvio que isso pode mudar. Não estamos totalmente tranquilos. Também temos dificuldades de acesso a algumas mercadorias, como fertilizantes", aponta.
Nesta quinta, o Ministério da Economia relacionou a queda do PIB às condições do clima.
"É fundamental distinguir o que é política econômica de fatores climáticos adversos e pontuais da natureza", afirmou a SPE (Secretaria de Política Econômica), vinculada à pasta.
"A maior crise hídrica em 90 anos de história e a ocorrência de severas geadas tiveram impacto tanto em setores intensivos em energia como em setores que dependem do clima, como agricultura", diz (Folha de S.Paulo, 3/12/21)