Uma agenda positiva para o agro no clima
Foto Reprodução-Blog Agrosmart
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Setor deve cobrar fim do 'pacote da destruição' no Congresso e endurecimento de penas para crimes ambientais.
Na semana na passada, 13 membros daquilo que se convencionou chamar "agro moderno" nacional enviaram uma carta ao Ministério do Meio Ambiente com uma proposta ousada: o Brasil, anfitrião da COP30, deveria simplesmente abrir mão de metas mais estritas de redução de emissões de carbono.
Tendo contribuído quase nada —segundo eles— para a crise climática ora instalada, o país em geral e o setor agro em particular deveriam investir em adaptação, já que hoje a sustentabilíssima produção rural brasileira é prejudicada por eventos extremos encomendados pelas emissões fósseis das nações ricas.
A carta tem timing estratégico: neste momento, o governo elabora o Plano Clima, de onde sairá a nova NDC ("Contribuição Nacionalmente Determinada"), a meta de corte de emissões para o período 2030-35 que o Brasil precisa entregar às Nações Unidas no fim deste ano. Embora o Acordo de Paris seja explícito em determinar que cada NDC precise ser mais ambiciosa que a anterior, e embora o mundo inteiro esteja olhando para o Brasil em busca de liderança nessa agenda, nosso agronegócio acha melhor darmos um passinho atrás.
Repitamos: este é o raciocínio do dito agro moderno, aquele que frequenta conferências do clima e encontros de ESG e que dialoga em fóruns como a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura. Porque o outro, o "ogronegócio", do qual essa turma diz querer se diferenciar, simplesmente nega o aquecimento global.
Longe de ser uma pobre vítima da crise do clima, o agronegócio brasileiro é responsável por 75% das emissões de gases de efeito estufa do sexto maior emissor de carbono do mundo. Só por desmatamento emitimos em 2022 1,1 bilhão de toneladas brutas de CO2 equivalente, fora as 600 milhões de toneladas de emissões diretas da agropecuária. Se fosse um país, nosso agro seria o sétimo maior poluidor climático do planeta, à frente do Japão.
E, embora a fatia do leão do aquecimento caiba aos combustíveis fósseis, o Brasil, que destruiu a mata atlântica a partir do século 19 e a Amazônia e o cerrado na segunda metade do 20, é um dos dez maiores responsáveis históricos pela mudança do clima.
Precisamos, portanto, fazer mais em corte de emissões. No último dia 26 de agosto, a sociedade civil brasileira mostrou quanto e como: o Observatório do Clima (OC) publicou uma proposta de NDC para o Brasil, com uma meta de corte de 92% das emissões líquidas do país até 2035, limitando-as a 200 milhões de toneladas (em 2022 emitimos 1,7 bilhão). A proposta do OC inclui entre suas principais medidas algo que o agro também reivindica: computar as remoções de carbono nos solos agrícolas para fins de cumprimento de meta. O setor faria melhor se gastasse seu poder de lobby para incluir essas remoções no inventário nacional, em vez de brigar por menos ambição no clima.
Conscientes da importância da agropecuária para o país, resolvemos propor uma agenda positiva mínima para o agro para este ano e o próximo. Ele deveria:
1 - Propor a retirada de pauta de todos os 25 projetos de lei e três PECs do "pacote da destruição". Já que se dizem tão preocupados com adaptação, os missivistas deveriam denunciar as propostas da bancada ruralista que flexibilizam a legislação ambiental e reduzem a resiliência do país;
2 - Aprovar no Congresso o endurecimento de penas para crimes ambientais. Num ano em que o Brasil inteiro está pegando fogo, com prejuízos inclusive para o agro, botar na cadeia quem faz queimada e desmatamento ilegal deveria ser prioridade máxima do setor. E, olha que legal, é uma medida de adaptação e mitigação ao mesmo tempo.
- Eliminar o financiamento a áreas embargadas, por bancos públicos ou privados (estamos falando com vocês, Banco do Brasil, ItaúBBA e Rabobank!);
- Demandar do governo uma NDC compatível com 1,5ºC, com desmatamento zero, recuperação total do passivo do Código Florestal e inclusão das remoções pelos solos agrícolas bem manejados.
Essas propostas posicionam o agro brasileiro na liderança da sustentabilidade global às vésperas da COP30. De quebra, ajudam a desembaçar a visão de quem lê a carta para o ministério e confunde seus 13 signatários com o mais arcaico "ogronegócio".
Adriana Ramos
Secretária-executiva do Instituto Socioambiental
Caetano Scannavino
Coordenador-geral do Projeto Saúde e Alegria
Carolina Pasquali
Diretora-executiva do Greenpeace Brasil
Délcio Rodrigues
Diretor-executivo do Instituto ClimaInfo
Marcio Astrini
Secretário-executivo do Observatório do Clima (Folha, 10/9/24)