Usinas do Brasil cancelam vendas de açúcar; fixação de preços está lenta
Desestimuladas pela queda dos preços no mercado externo e maior atratividade do etanol, as usinas brasileiras já cancelaram até 500 mil toneladas em contratos de exportação de açúcar, e a fixação de vendas futuras mostra-se lenta para esta época do ano, disseram especialistas à Reuters nesta segunda-feira.
Só em 2018, a referência do açúcar bruto na Bolsa de Nova York registra recuo de 26 por cento, para o menor patamar em anos, dada a perspectiva de ampla oferta. Esse tombo neutraliza, inclusive, o efeito positivo que o recente fortalecimento do dólar ante o real poderia gerar às usinas.
“Com essa disparada do dólar, o valor em reais (do açúcar) é o mesmo de quase um mês atrás. O valor de liquidação do açúcar é praticamente o mesmo”, afirmou o diretor da Archer Consulting, Arnaldo Luiz Corrêa.
De acordo com ele, esse cenário levou as companhias a cancelarem até agora “entre 400 mil e 500 mil toneladas” de açúcar em contratos de exportação para a safra 2018/19, um volume que equivale a cerca de 2 por cento dos embarques potenciais do Brasil no ciclo —e mais “washouts”, como são conhecidas tais operações, podem ocorrer caso não haja reação nos preços do adoçante.
“A usina cancela o contrato, e aquela cana que iria para produção de açúcar, vai para a de etanol”, explicou Corrêa.
O álcool, que já vinha se mostrando atrativo para as usinas desde o ano passado, na esteira de mudanças tributárias, ganhou ainda mais atenção em 2018 graças à melhor competitividade frente a gasolina e ao derretimento das cotações do açúcar.
Em abril, por exemplo, a produção do biocombustível no centro-sul saltou mais de 60 por cento, segundo dados da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), após as vendas em postos terem aumentado 36 por cento no primeiro trimestre, de acordo com números da reguladora ANP.
O Brasil é o maior produtor e exportador mundial de açúcar, com vendas superiores a 20 milhões de toneladas por ano.
FIXAÇÃO ATRASADA
Na avaliação do analista Eduardo Sia, da Sucden, além de “washouts”, também são observadas neste ano operações de carrego do açúcar para vendas posteriores. Em linhas gerais, é como se a usina rolasse para o futuro a entrega de açúcar para focar na fabricação de etanol agora.
Fora isso, acrescentou Sia, há também uma “lentidão” nos destinos que adquirem o açúcar brasileiro —em abril, as exportações nacionais do adoçante bruto diminuíram 31 por cento.
“Não está em níveis críticos, de fazer estoques nos terminais, mas está mais lento mesmo... O destino já fez sua programação e está quieto, um pouco tímido”, afirmou.
Perante tudo isso, chama atenção a fixação de preços para vendas futuras de açúcar. Pela média histórica recente, a comercialização já deveria estar nesta época em cerca de 60 por cento da exportação total esperada, segundo o analista, que mencionou que o Brasil não vendeu nem metade dos embarques previstos para toda safra.
O sócio-diretor da consultoria Canaplan, Luiz Carlos Corrêa Carvalho, concorda e diz que a fixação até o momento está “entre 30 e 35 por cento”.
“As usinas estão na expectativa de uma recuperação de preços, que não vem, e a fixação não acontece”, afirmou Corrêa Carvalho, também presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag).
O mais recente line-up da agência marítima Williams mostrou que a fila de navios para embarcar açúcar no Brasil totalizava 23 na semana encerrada em 9 de maio. Em anos anteriores, com a safra no centro-sul ganhando ritmo, essa quantidade se aproximava de 40 (Reuters, 14/5/18)