Usinas eólicas e solares ampliam aposta em contratos privados de energia
Investidores em energia eólica e solar no Brasil têm ampliado fortemente as apostas na viabilização de projetos por meio de contratos privados, no chamado mercado livre de eletricidade, em tendência que marca mudança importante para a indústria no país, mostraram estudos de consultorias do setor.
Se antes as empresas de energia aguardavam com enorme ansiedade os leilões promovidos pelo governo para contratar novos empreendimentos, que oferecem contratos de longo prazo para compra da produção das usinas, agora multinacionais como Enel, EDP Renováveis, Iberdrola, Engie e EDF encontram outros caminhos para colocar em pé seus investimentos no Brasil.
No ano passado, outorgas emitidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para novos projetos de geração somaram 10,8 gigawatts em capacidade, dos quais um recorde de 82,8% foram para usinas que venderão energia no mercado livre. Em 2018, de 6,35 gigawatts em outorgas, apenas 5% buscavam contratos privados, segundo estudo da consultoria ePowerBay.
As outorgas para usinas solares ainda saltaram para 5,8 gigawats em 2019, de 1,33 gigawatt em 2018, com apenas 3,6% delas direcionadas ao mercado regulado, para atender distribuidoras de energia por meio dos leilões, de acordo com o levantamento.
Entre parques eólicos também houve forte crescimento nas outorgas, para 4,1 gigawatts, de 2,35 gigawatts em 2018, com 70% delas prevendo negociar a energia no mercado livre.
“Foi uma saída, uma alternativa que as empresas acabaram encontrando, porque elas eram muito dependentes dos leilões de energia (do governo). Como os leilões não estavam atendendo à demanda delas, acabaram encontrando um caminho novo”, disse à Reuters o sócio-diretor da ePowerBay, Afonso Lugo.
A mudança de foco, lembrou ele, começou em meio à crise econômica que atingiu o Brasil entre meados de 2014 e o final de 2016 e reduziu significativamente o ritmo de contratação de empreendimentos nos leilões governamentais mesmo nos anos seguintes.
Ao mesmo tempo, uma disparada das tarifas das distribuidoras a partir de 2015 levou a uma grande migração de indústrias e outras empresas para o mercado livre de eletricidade, em busca de energia mais competitiva.
O movimento dos investidores em geração antes mirava a venda de parte da energia dos projetos no mercado livre, como um complemento à receita obtida nos leilões regulados, mas hoje muitas elétricas já viabilizam os projetos apenas com os contratos privados, apontou Lugo.
A portuguesa EDP Renováveis, por exemplo, já anunciou um projeto eólico e um solar no Brasil com vendas apenas no mercado livre, para clientes não revelados, enquanto a francesa Engie tem viabilizado complexos eólicos com venda da produção para empresas como o grupo de telefonia Claro.
O levantamento da ePowerBay mostra que companhias como as espanholas Solatio e Elecnor, a italiana Enel, a EDP Renováveis, a canadense Canadian Solar e até a petroleira britânica BP estão entre os principais agentes que obtiveram outorgas para projetos solares no mercado livre.
Nos empreendimentos eólicos, a Enel, a Neoenergia, controlada pelos espanhóis da Iberdrola, e as francesas Voltalia, Engie e EDF estão entre os principais investidores mirando contratos privados, assim como a CPFL, da chinesa State Grid, e as locais Casa dos Ventos e Omega Geração.
MOVIMENTO GLOBAL
Segundo a consultoria em energia renovável Bloomberg New Energy Finance (BNEF), o volume de contratos corporativos de compra de energia limpa disparou no Brasil no ano passado, com salto de 384%. Foram 640 megawatts em negócios, contra 132 megawatts em 2018.
“Nós estamos otimistas com o mercado de contratos corporativos (PPAs) brasileiro devido aos fortes recursos eólicos do país e aos crescentes compromissos de sustentabilidade das empresas... ambos fatores abrem caminho para o mercado no Brasil continuar a crescer”, disse à Reuters o analista da Kyle Harrison, autor de estudo da BNEF sobre o tema.
Em âmbito global, a indústria de contratos privados também teve forte crescimento, embora em ritmo bastante abaixo do verificado no Brasil.
Em 2019, mais de 100 empresas em 23 países assinaram contratos para viabilizar 19,5 gigawatts em usinas de energia renovável, com expansão de 40% frente ao ano anterior e triplicando as atividades frente a 2017, segundo a BNEF (Reuters, 7/2/20)