29/10/2018

Versão mais modesta da tecnologia de IA vem conquistando espaços no trabalho de retaguarda nos escritórios.

Versão mais modesta da tecnologia de IA vem conquistando espaços no trabalho de retaguarda nos escritórios.

Não faltam previsões de como a inteligência artificial (IA) vai definir onde, como e se as pessoas vão trabalhar no futuro.

Mas os grandes projetos de IA para mudanças no trabalho, como carros autônomos e robôs humanoides, ainda não são produtos comerciais. Em vez disso, uma versão mais modesta da tecnologia vem avançando num ponto menos glamouroso: o trabalho de retaguarda nos escritórios.

Softwares estão automatizando tarefas mais mundanas de empresas, como contabilidade, cobrança, pagamento e atendimento ao cliente. Com uns poucos toques no teclado, os programas escaneiam documentos, montam planilhas, conferem a assiduidade de clientes e fazem pagamentos.

A tecnologia ainda está na infância, mas se aperfeiçoa e “aprende” à medida que avança. Até agora, geralmente com projetos-pilotos voltados para tarefas subalternas, a IA vem mais liberando trabalhadores de tarefas cansativas do que extinguindo empregos.

‘A forma menos inteligente de inteligência artificial’

O trabalho dos chamados bots (diminutivo de robô – softwares que automatizam procedimentos repetitivos) geralmente se resume a seguir regras simples, não tomar decisões e não fazer escolhas de alto nível que requeiram julgamento e experiência. “É a forma menos inteligente de inteligência artificial”, resume Thomas Davenport, professor de tecnologia da informação e administração na Babson College.

Mas muito mais está por vir. Gigantes da tecnologia como IBM, Oracle e Microsoft começam a entrar no ramo, frequentemente em parceria com startups de robotização. Duas dessas startups, UiPath e Automation Anywhere, já valem mais de US$ 1 bilhão cada. Segundo um estudo, o mercado de softwares de robótica deve quase triplicar até 2021.

“É o início de uma onda de tecnologias de IA que vai proliferar em toda a economia na próxima década”, diz Rich Wong, sócio da Accel, empresa de investimentos de risco do Vale do Silício e investidor na UiPath.

O novo campo é conhecido pela sigla RPA (de robotic process automation). Seus programas (bots) simulam ações humanas repetidas e se enquadram na definição mais ampla de inteligência artificial por usarem ingredientes da  tecnologia de IA – como computadores que “enxergam” – na execução de tarefas corriqueiras.

Para o mundo empresarial, é uma festa. Perto de 60% das empresas com mais de US$ 1 bilhão de faturamento já têm no mínimo programas-pilotos usando RPA , segundo pesquisa da McKinsey & Company.

Empresas e agências governamentais que começaram a usar softwares de automaçãocobrem um amplo leque de atividades. A lista inclui General Motors, BMW, General Electric, Unilever Mastercard, Manpower, Cisco, Google, o Departamento de Defesa e a Nasa.

Seguradora tem 30 programas executando tarefas de escritório

A empresa de seguros State Auto Insurance Companies, de Columbus, Ohio, começou seu primeiro projeto de automação há dois anos. Hoje, tem 30 programas de software executando tarefas rotineiras de escritório. A economia  estimada é de 25 mil horas de trabalho humano – ou o equivalente a uma dezena de trabalhadores full-time –considerando-se uma base anual de 2 mil horas de trabalho.

Holly Uhl, a gerente de tecnologia que chefia o programa de automação da State, calcula que em dois anos o número de bots da empresa terá dobrado para 60, com as horas economizadas talvez triplicando para 75 mil.

A intenção, segundo Uhl, não é cortar empregos. A meta da State Auto, cujas coberturas incluem seguro de carros, seguros comerciais e de compensação para trabalhadores, é aumentar a produtividade e os lucros com pouco acréscimo de pessoal, diz ela.

A mensagem de Uhl para os funcionários é: “Juntos, vamos acabar com essas tarefas que deixam todo mundo louco”.

Rebekah Moore, que calcula preços de seguros na State, tem uma dessas tarefas em mente. Moore avalia apólices e faz recomendações para mudanças de tarifas. Menos da metade das apólices precisam ser recalculadas.

As que não são alteradas são então separadas para arquivamento. Essa é uma parte rotineira e monótona do trabalho que leva um ou dois minutos, mas como se trata de milhares de apólices , representa uma hora a mais de trabalho da equipe. Desde maio, um bot vem  fazendo a tarefa. “Ninguém se queixou de ‘usurpação’ de função”, diz Moore.

Será que ela não teme que os bots algum dia possam substituí-la? Moore responde que não. “Simplesmente empregaremos mais de modo mais lucrativo o tempo economizado”, afirma.

Empresa prevê contratar mais em vez de dispensar

Pelo ritmo atual de crescimento da State Auto, essa confiança parece justificada. Se a empresa atingir a meta de economizar 75 mil horas de trabalho por volta de 2020, isso levaria à suposta dispensa de menos de 40 funcionários de tempo integral de uma força de trabalho hoje de 1.900 funcionários. Mas a empresa planeja crescer nos próximos dois anos. Se isso acontecer, é mais provável que, em vez de dispensar funcionários, contrate mais algumas dezenas.

Empresas de automação procuram promover seus bots mais como bons ajudantes que como exterminadores de empregos. A tecnologia, segundo elas, vai ficar mais inteligente e mais útil, liberando trabalhadores, não substituindo-os.

“No longo prazo, teremos um bot para cada funcionário”, disse Bobby Patrock, chefe de marketing da UiPath. A empresa, baseada em Nova York, informou recentemente que seu faturamento mais que triplicou na primeira metade de 2018, para uma taxa anual de mais de US$ 100 milhões.

Mihir Shukla, diretor da Automation Anywhere, qualifica os bots produzidos pela empresa de “colegas digitais”. Em julho, a Automation Anywhere anunciou que o levantamento de US$ 250 milhões em investimentos de risco, estando hoje avaliada em US$ 1,8 bilhão (The New York Times, 27/10/18)